A arte da fermentacao - Sandor Ellix Katz PDF

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Título original: The art of fermentation Copyright © 2012, Sandor Ellix Katz Copyright © 2014, Pioneira Editorial Ltda. São Paulo, para a presente edição. EDIÇÕES TAPIOCA EDITORES Renato C. Guazzelli José Carlos de Souza Jr COORDENAÇÃO EDITORIAL Fernanda Marão TRADUÇÃO Cristina Yamagami REVISÃO TÉC...


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Título original: The art of fermentation Copyright © 2012, Sandor Ellix Katz Copyright © 2014, Pioneira Editorial Ltda. São Paulo, para a presente edição. EDIÇÕES TAPIOCA EDITORES Renato C. Guazzelli José Carlos de Souza Jr COORDENAÇÃO EDITORIAL Fernanda Marão TRADUÇÃO Cristina Yamagami REVISÃO TÉCNICA Amanda Reitenbach PRODUÇÃO EDITORIAL Crayon Editorial ILUSTRAÇÕES Caroline Paquita (bactérias) Elara Tanguy (capítulos) SESI-SP EDITORA EDITOR CHEFE Rodrigo de Faria e Silva PRODUÇÃO GRÁFICA Paula Loreto Valquíria Palma Camila Catto COMUNICAÇÃO EDITORIAL Gabriella Plantulli DIVULGAÇÃO E PROMOÇÃO Valéria Vanessa Eduardo Renata de Cassia Silva PRODUÇÃO DO ARQUIVO EPUB Booknando Livros CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO

K31a Katz, Sandor Ellix, 1962A arte da fermentação : explore os conceitos e processos essenciais da fermentação praticados ao redor do mundo / Sandor Ellix Katz; tradução Cristina Yamagami. – 1. ed. – São Paulo : Tapioca, 2014. 585p. : il ; 25 cm. Tradução de: The art of fermentation Inclui índice ISBN 978-85-67362-06-9 1. Fermentação. 2. Culinária. 3. Nutrição. I. Título. 14-14764

2014 Todos os direitos desta edição reservados à Pioneira Editorial Ltda. Av. Rouxinol, 84 - cj. 114 04516-000 São Paulo - Brasil Tel. 55 (11) 5041-8741 [email protected] www.edicoestapioca.com.br

2014 SESI-SP Editora Av. Paulista, 1.313 01311-923 São Paulo - Brasil Tel. 55 (11) 3146-7308 [email protected] www.sesispeditora.com.br

CDD: 641.5 CDU: 641.5

Para o meu pai, Joe Katz, que adorava conversar sobre as hortaliças que cultivava em sua horta e sobre tudo o que ele e a minha madrasta Pattie preparavam com elas. Eles foram a minha inspiração. Dedico este livro a ele e aos outros incontáveis professores, mentores e anciães que me orientaram e inspiraram ao longo da minha vida.

O que estão dizendo sobre A arte da fermentação

“A arte da fermentação é muito mais que um livro de receitas [...] É bem verdade que o livro ensina como fermentar, mas, muito mais importante que isso, ele também ensina as implicações da fermentação e por que um ato tão cotidiano e prático como fazer o próprio chucrute é uma maneira de se engajar no mundo – e mais que isso, uma maneira de se engajar em vários mundos diferentes, um aninhado dentro do outro: o mundo invisível dos fungos e bactérias, a comunidade na qual você vive e a indústria alimentícia, que está minando a saúde do nosso corpo e do nosso planeta. Isso tudo pode parecer grandioso demais para um simples pote de chucrutes, mas a incrível façanha que Sandor Katz conseguiu realizar neste livro é convencer o leitor da verdade dessa alegação. Fermentar a sua própria comida significa fazer um eloquente protesto – dos sentidos – contra a homogeneização dos sabores e das experiências alimentares que hoje se estende como uma vasta planície indiferenciada por todo o nosso planeta. O ato também é uma declaração de independência a uma economia que prefere que sejamos todos consumidores passivos de suas commodities em vez de criadores de produtos originais que expressem nós mesmos e os lugares onde vivemos.” — Michael Pollan, do Prefácio

“A arte da fermentação é um livro extraordinário, de impressionante paixão e erudição. Nessa obra, Katz apresenta os fundamentos para fermentar todo tipo de alimentos e o leitor conquistará a liberdade de seguir qualquer receita de fermentação (e se livrar do nervosismo que poderia estar nutrindo no que se refere ao tema). Estou absolutamente impressionada... e pronta para botar as mãos na massa! Muito obrigada, Sandor Katz.”

— Deborah Madison, autora de Vegetarian cooking for everyone e local flavors

“Sandor Katz prova ser o ‘rei da fermentação’ com este novo livro, um extenso compêndio de sabedoria e técnicas do mundo todo – e, como se isso não bastasse, gostoso de ler. Leitura obrigatória para qualquer pessoa interessada em alimentação e nutrição. — Sally Fallon Morell, presidente da The Weston A. Price Foundation

“Sandor Katz já despertou mais pessoas para a diversidade e as delícias dos alimentos fermentados do que qualquer outro conseguiu fazer no decorrer do século passado. Uma vez que você começa a ver o mundo pelos olhos de um gênio como Katz, não terá mais como voltar ao mundo insípido no qual vivia antes. A arte da fermentação é um verdadeiro tesouro: rico em conhecimento e, ainda por cima, de aplicação prática. Este livro promete ser um clássico do próximo milênio.” — Gary Paul Nabhan, autor de Renewing America’s food traditions e Desert terroir

“A arte da fermentação é um testemunho incrível da surpreendente paixão de Sandor Katz por tudo o que se refere à fermentação. História, ciência e uma sabedoria simples e prática se entrelaçam nessa profunda jornada pela impressionante diversidade de alimentos e bebidas que se fundamentam na fermentação.” — Charlie Bamforth, professor do Departamento de Tecnologia e Ciência dos Alimentos da Universidade da Califórnia em Davis, e autor de Food, fermentation and micro-organisms

“Este é simplesmente o melhor livro sobre fermentação disponível no mercado. É abrangente, erudito e surpreendentemente profundo. Sandor Katz é o guru de uma grande e crescente tribo de entusiastas da fermentação e este livro despertará o leitor para o empolgante mundo das bactérias benignas que nos cercam. Elas não apenas nos proporcionam o picles, o queijo, o pão e as bebidas alcoólicas, mas também a nossa existência depende delas, que merecem toda a nossa reverência e respeito.” — Ken Albala, historiador da alimentação e coautor do livro The lost arts of hearth and home: the luddite’s guide to domestic self-sufficiency

“A arte da fermentação se volta ao nosso bem-estar pessoal, apresentando uma explicação absolutamente envolvente sobre os micro-organismos, selvagens ou domesticados, mas em geral pouco valorizados. Com base em teorias, ciência e observações práticas, Sandor Katz deixa, nestas páginas, milhares de pontos, para que possamos ligá-los com as nossas próprias experiências e interesses. O conteúdo deste livro é relevante para todos. Independentemente de estarmos em guerra ou em paz com as minúsculas criaturas que chamamos de micro-organismos, não podemos deixar de concluir que elas são os elementos constitutivos das comunidades que convivem no nosso organismo. A paixão do autor pela fermentação é contagiosa. Lendo este livro, é fácil se ver desbravando a nossa própria jornada mapeada nesta obra absolutamente envolvente.” — Charlie Papazian, autor de The complete joy of homebrewing

“Sandor Katz documenta a essência da fermentação neste novo livro, que fervilha de informações científicas, históricas e práticas sobre a primeira biotecnologia da humanidade e a primeira fonte de energia do planeta. O mistério e o fascínio sensorial dos produtos naturalmente fermentados – incluindo frutas, mel, leite, todos os tipos de talos, tubérculos, cereais amiláceos e até peixes e carnes – são apresentados com entusiasmo e lucidez e prometem interessar tanto os epicuristas quanto os adeptos do ‘faça você mesmo’.”

— Patrick E. McGovern, diretor científico do Laboratório de Arqueologia Biomolecular do Museu de Arqueologia e Antropologia da Universidade da Pensilvânia e autor de Ancient wine e Uncorking the past

SUMÁRIO Prefácio Agradecimentos Introdução CAPÍTULO 1. A fermentação como uma força coevolucionária Bactérias: nossos ancestrais e parceiros coevolucionários Fermentação e cultura Fermentação e coevolução A fermentação como um fenômeno natural A guerra contra as bactérias Cultivando uma consciência biofílica CAPÍTULO 2. Os benefícios práticos da fermentação Os benefícios da fermentação para a conservação e limites Os benefícios dos alimentos fermentados para a saúde A fermentação como uma estratégia de eficiência energética Os extraordinários sabores da fermentação CAPÍTULO 3. Conceitos básicos e equipamentos Substratos e comunidades microbianas Fermentação selvagem ou por inoculação de culturas Ambientes seletivos Evolução e sucessão de comunidades de fermentação Limpeza e esterilização Contaminação cruzada Água Sal Escuridão e luz solar Recipientes de fermentação Método do vidro de conserva

Método do pote de cerâmica Tampas de potes de cerâmica Diferentes modelos de potes de cerâmica Recipientes de metal Recipientes de plástico Recipientes de madeira Canoa Cabaças e outros recipientes para fermentação feitos de frutas Cestas Fermentação em covas Prensas de conserva Utensílios para cortar vegetais Utensílios para bater ou amassar os vegetais Recipientes e válvulas airlock para a produção de bebidas alcoólicas Sifões e trasfega Garrafas e envasamento Densímetros Termômetros Prensas de uva e sidra Moedores de grãos Utensílios para cozimento a vapor Câmaras de incubação Câmaras de cura Controladores de temperatura Fita crepe e pincéis atômicos CAPÍTULO 4. Transformando açúcares em álcool pela fermentação: hidromel, vinhos e sidras Leveduras Hidromel simples Melhorias botânicas do hidromel: t’ej e baälche Hidroméis de frutas e flores Simples e curto versus seco e maturado

Método do cultivo contínuo de starters Elixires de hidromel à base de plantas Vinho de uvas Sidra e perada Country wines à base de açúcar Bebidas alcoólicas feitas com outros adoçantes concentrados Saladas de frutas fermentadas Bebidas fermentadas de seiva de plantas Carbonatação de bebidas alcoólicas Misturando as fontes de carboidrato Identificando e resolvendo problemas CAPÍTULO 5. Fermentando hortaliças (e algumas frutas também) Bactérias ácido-lácticas Vitamina C e vegetais fermentados Os fundamentos do kraut-chi Picar Salgar com salga seca ou salmoura Bater ou espremer os vegetais (ou mergulhá-los em salmoura) Comprimir Quanto tempo deixar fermentando? Bolores e leveduras na superfície Quais vegetais podem ser fermentados? Temperos Chucrute Kimchi Picles chineses Conservas indianas Fermentação de molho picante, molho em conserva, salsa, chutney e outros condimentos Gundruk e sinki himalaio Ponderações para fermentar vegetais sem sal Salmoura

Picles azedos Cogumelos na salmoura Azeitonas na salmoura Vagens em conserva Fermentação lática de frutas Kawal Adicionando starters aos vegetais fermentados Formas líquidas de vegetais fermentados: beterraba e kvass de alface, suco de repolho fermentado, kaanji e salgam suyu Tsukemono: estilos japoneses de conserva Cozinhando com vegetais fermentados Laphet (folhas de chá fermentadas) Identificando e resolvendo problemas CAPÍTULO 6. Fermentação de bebidas tônicas azedas Carbonatação Ginger beer com o bichinho do gengibre Kvass Tepache e aluá Mabí/mauby Quefir de água (também chamado de tibicos) O soro como starter Root beer Pru Bebida fermentada de batata-doce Sabores criativos de bebidas gaseificadas Smreka Noni Kombucha: uma panaceia ou um perigo? Produção do kombucha Doce de kombucha: nata Jun Vinagre

Shrub Identificando e resolvendo problemas CAPÍTULO 7. Fermentação do leite Leite cru: microbiologia e política Coagulação simples do leite Iogurte Quefir Viili Outras culturas lácteas Origens vegetais das culturas lácteas Crème fraîche, manteiga e buttermilk Soro Queijo Produção de queijo industrial versus em fazendas Leites, iogurtes e queijos não lácteos Identificando e resolvendo problemas CAPÍTULO 8. Fermentação de cereais e tubérculos amiláceos Padrões arraigados Imersão de cereais Germinação Rejuvelac Mingaus Fermentação da aveia Grits/polenta Atole agrio Mingau de painço Mingau de sorgo Congee de arroz Mingau de pão velho Mingau de batata Poi

Mandioca Pães de mandioca da América do Sul Fermentação de batatas Como iniciar e manter o fermento natural Pães sem fermento/panquecas Pão de fermento natural Sopa de mingau de centeio azedo (zur) Arroz sierra Appam Kishk e Keckek el Fouqara Fermentação de cereais com outros tipos de alimentos Fermentação de sobras de cereais (e tubérculos amiláceos) Identificando e resolvendo problemas CAPÍTULO 9. Fermentação de cervejas e outras bebidas alcoólicas à base de cereais Cervejas de leveduras selvagens Tesgüino Cerveja de sorgo Merissa (cerveja sudanesa de sorgo torrado) Bebidas asiáticas de arroz Cerveja básica de arroz Makgeolli de batata-doce Tongba de painço Saquê Maltagem da cevada Cerveja de cevada opaca simples Cervejas de mandioca e batata Além do lúpulo: cervejas feitas com outras ervas e outros aditivos vegetais Destilação CAPÍTULO 10. Cultivo de culturas de fungos Câmaras de incubação para o cultivo de fungos

Fazendo tempeh Cozinhando com tempeh Propagação de esporos do tempeh Preparação do koji Amazake Fontes vegetais de culturas de bolor Identificando e resolvendo problemas CAPÍTULO 11. Fermentação de leguminosas, sementes e nozes Fermentação de queijos de sementes/nozes, patês e leites Bolotas Óleo de coco Fermentação de cacau, café e baunilha Fermentação espontânea de leguminosas Idli/dosa/dhokla/khaman Acarajé Soja Missô Utilizações do missô Molho de soja Hamanatto e Douchi Natô Dawadawa e condimentos similares de sementes fermentadas da África Ocidental Fermentação do tofu Identificando e resolvendo problemas CAPÍTULO 12. Fermentação de carnes, peixes e ovos Secagem, salga, defumação e cura Os fundamentos da cura a seco Salmoura: corned beef e língua Embutidos curados a seco Molho de peixe Peixe em conserva

Fermentação de peixe com cereais Burong isda e balao-balao filipino Narezushi japonês Fermentação de peixes e carnes com soro de leite, chucrute e kimchi Fermentação de ovos Óleo de fígado de bacalhau Peixe e carne enterrados High meat Ética no consumo de carnes e peixes CAPÍTULO 13. Ponderações relativas a empreendimentos comerciais Uniformidade Primeiros passos Ampliando as operações Códigos, regulamentos e autorizações Diferentes modelos de negócios: operações baseadas em fazendas, diversificação e especialização CAPÍTULO 14. Aplicações não alimentares da fermentação Agropecuária Biorremediação Gestão de resíduos Descarte de corpos humanos Artes com fibras, construção e decoração Produção de energia Aplicações medicinais da fermentação Fermentação para cuidados da pele e aromaterapia A fermentação e as artes Epílogo: Um manifesto revivalista cultural Glossário Uma observação sobre as referências Informações e referências

Livros consultados Notas Índice de referência

PREFÁCIO

arte da fermentação é um livro literalmente inspirador. Katz me inspirou a fazer coisas que eu nunca tinha feito antes e que provavelmente jamais faria se não tivesse lido este livro. Para você ter uma ideia, o livro de Katz é a principal razão pela qual os balcões da minha cozinha e o chão do meu porão estão repletos de uma variedade de vidros de geleia, potes de cerâmica, garrafas e garrafões, com os recipientes transparentes resplandecendo cores sobrenaturais. Desde que caí sob o feitiço evangelizador de Katz no que se refere à fermentação, fiz potes enormes de chucrute e kimchi; inúmeros vidros de pepino, cenoura, beterraba, couve-flor, cebola, pimentão e alho selvagem em conserva; potes de iogurte e quefir; e garrafões de vinte litros de cerveja e hidromel. Nunca me esqueço de que todos eles estão vivos. De madrugada, quando a casa está em silêncio, posso ouvir os meus fermentos borbulhando satisfeitos. O som se tornou uma profunda fonte de satisfação para mim, porque sei que os meus microorganismos são felizes. Leio livros de receita o tempo todo, mas nenhum deles me inspirou a colocar a mão na massa. Por que A arte da fermentação é tão diferente? Para começar, Sandor Katz escreve sobre o poder transformador da fermentação com um entusiasmo tão contagiante que leva o leitor a querer testar as coisas “só para ver o que acontece”. Foi assim que me senti quando a minha professora do primário nos disse que algo milagroso aconteceria se misturássemos um pouco de vinagre com bicarbonato de sódio. Essas transformações microbianas são milagrosas e, em geral, o mesmo pode ser dito de seus resultados: novos e formidáveis sabores e interessantes texturas são criadas com os ingredientes mais corriqueiros – e não por nós, mas por bactérias e fungos. Outra razão pela qual Katz nos inspira a testar receitas de coisas que você nem sabia que existiam (kvass? shrub?!) é que ele jamais nos intimida. Pelo contrário. Tal qual um livro de receitas – e, como veremos, este livro é muito mais que um livro de receitas

A

–, A arte da fermentação coloca nas nossas mãos um enorme poder. Embora o livro transite por vários mistérios microbianos, Katz é, por natureza, um desmistificador: ele nos garante que não é tão complicado assim e que qualquer um pode fazer chucrute, basta seguir as instruções. E se alguma coisa der errado? E se uma verdadeira barba de bolor crescer no seu chucrute? Não precisa entrar em pânico, basta raspar o bolor e saboreá-lo. Mas essa atitude não se fundamenta apenas no temperamento tranquilizador de Sandor Katz na cozinha... ela também tem raízes políticas. A arte da fermentação é muito mais que um livro de receitas. Ou, melhor dizendo, é um livro de receitas da mesma forma como A arte cavalheiresca do arqueiro zen é um guia prático sobre arcos e flechas. É bem verdade que o livro ensina como fermentar, mas, muito mais importante que isso, ele também ensina as implicações da fermentação e por que um ato tão cotidiano e prático como fazer o próprio chucrute é uma maneira de se engajar no mundo – e mais que isso, uma maneira de se engajar em vários mundos diferentes, um aninhado dentro do outro: o mundo invisível dos fungos e bactérias, a comunidade na qual você vive e a indústria alimentícia, que está minando a saúde do nosso corpo e do nosso planeta. Isso tudo pode parecer grandioso demais para um simples pote de chucrutes, mas a incrível façanha que Sandor Katz conseguiu realizar neste livro é convencer o leitor da verdade dessa alegação. Fermentar a sua própria comida significa fazer um eloquente protesto – dos sentidos – contra a homogeneização dos sabores e das experiências alimentares que hoje se estende como uma vasta planície indiferenciada por todo o nosso planeta. O ato também é uma declaração de independência a uma economia que prefere que sejamos todos consumidores passivos de suas commodities em vez de criadores de produtos originais que expressem nós mesmos e os lugares onde vivemos. Porque o seu chucrute ou a sua cerveja caseira serão únicos, diferentes dos meus ou de qualquer outra pessoa. Os coreanos, que estão longe de ser amadores na arte da fermentação, fazem a distinção entre o “gosto da boca” e o “gosto da mão”. O “gosto da boca” é o mero resultado das moléculas entrando em contato com as papilas gustativas, o tipo de sabor barato e fácil que qualquer cientista dos alimentos ou indústria alimentícia é capaz de produzir. Já o “gosto da mão” é a experiência muito mais complexa de um alimento que traz a marca indelével – a atenção e, por vezes, até o amor – da pessoa que o fez. O chucrute que você fizer com as suas próprias mãos terá esse sabor especial.

E, pode acreditar, você terá muito o que compartilhar. Uma das grandes vantagens de fazer os próprios alimentos fermentados é poder dá-los aos outros, saindo da economia monetária. Agora, eu troco garrafas de cerveja e hidromel com outros produtores caseiros e participo de um rico comércio na forma de potes, que saem da minha casa cheios de chucrute e voltam cheios de kimchi ou picles feitos por outras pessoas. Mergulhar no mundo dos alimentos fermentados é entrar na comunidade dos amantes dos fermentos, um grupo absolutamente interessante, excêntrico e generoso. Além disso, A arte da fermentação também serve como uma espécie de passaporte ou visto para ingressar em ainda outra comunidade: a comunidade invisível dos fungos e bactérias que vivem ao nosso ...


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