Tópicos Coulthard (2014 ) PDF

Title Tópicos Coulthard (2014 )
Author Lucas Guerra
Course Desigualdades, Identidades e Diferença nas Relações Internacionais
Institution Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
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 Tópicos COULTHARD, Glen S. (2014). Red skin, white masks. COULTHARD, G. Red skin, white masks: rejecting the colonial politics of recognition. Minneapolis: Univeristy of Minnesota Press, 2014.

 Introdução: Sujeitos do Império  De “tutelados pelo Estado” a sujeitos de reconhecimento? * O autor dá início ao capítulo apontando como o reconhecimento da igualdade como nação autônoma, com direito a autogoverno sobre seu território e a relações de par-a-par com outras nações, se tornou pauta central do movimento das First Nations canadenses a partir da década de 1990, assumindo também um papel protagonista nas demandas indígenas articuladas em nível internacional (ou isoladas ao redor do globo) (p. 1-2). * Objetivo do autor no livro é indicar que esse tipo de “política do reconhecimento” dominante é insuficiente para romper as relações coloniais entre os povos indígenas e o Estado canadense. Isso porque assumiria a forma de um pluralismo liberal baseado em uma ideia falsa de reciprocidade, gerando como resultado, em última instância, a reprodução e legitimação do mesmo Estado colonialista, racista e patriarcal que os movimentos indígenas e suas demandas por reconhecimento buscam transcender (p. 3). * Afirma que o “reconhecimento” mútuo, como o sedimentado pelo Estado canadense, é mais um reflexo das estruturas de assimilação e extermínio sofrida pelas First Nations desde ao menos o século XIX, em sua tentativa de anular qualquer distinção entre indígenas e canadenses, apagando a preocupação com as suas peculiaridades (p. 4). * “More specifically, I argue that the expression of Indigenous anticolonial nationalism that emerged during this period forced colonial power to modify itself from a structure that was once primarily reinforced by policies, techniques, and ideologies explicitly oriented around the genocidal exclusion/assimilation double, to one that is now reproduced through a seemingly more conciliatory set of discourses and institutional practices that emphasize our recognition and accommodation. Regardless of this modification, however, the relationship between Indigenous peoples and the state has remained colonial to its foundation” (p. 6). 

Marx, Colonialismo de Povoamento e Expropriação Indígena no Canadá pós-White Paper

* Identifica a existência e permanência de relações coloniais nas quais o poder – racial, econômico, de gênero, estatal – se estrutura em torno da sedimentação de relações sociais hierárquicas que permitem uma constante despossessão dos povos indígenas de suas terras e de seu direito à autodeterminação e autoridade (p. 6-7). * Para o autor, a questão central e primordial do colonialismo é o território, que há um só tempo é fonte da existência material e espiritual dos indígenas e fonte da formação do Estado colonial, do povoamento e do desenvolvimento capitalista para os ‘homens brancos’ (p. 7). * Volta às ideias de Marx sobre a acumulação primitiva de capital para pensar nessa questão. Em suma, como o desenvolvimento produtivo/econômico e das relações sociais capitalistas só foi possível com a expropriação de terras de sociedades ‘précapitalistas’, em especial através do colonialismo europeu (p. 7). Por meio da violência, possibilitou a maior consolidação da propriedade privada sobre terras antes coletivas, bem como a proletarização massiva dos que outrora habitavam essas terras (p. 7-8). * Para Coulthard, as relações entre colonialismo e capitalismo enfatizadas por Marx não devem ser marginalizadas nos estudos indígenas. Não defende, porém, uma assimilação automática do marxismo, e reconhece que a teoria do autor deve ser relida e reinterpretada de acordo com as perspectivas indígenas (p. 8). * Nesse sentido, ressalta três pontos que carecem de uma revisão a partir de um prisma indígena: (1) a dimensão temporal da acumulação primitiva apresentada por Marx, como algo “passado”. Autores como Harvey reveem essa questão, apontando que a expropriação violenta segue sendo parte inerente do capitalismo em escalas nacional e global mesmo sob a atual égide da hegemonia neoliberal (p. 9); (2) o desenvolvimentismo normativo presente no pensamento de Marx, na forma de uma metanarrativa eurocêntrica que aponta o processo de acumulação primitiva como inevitável e mesmo benéfico para as populações que o sofrem, por trazê-las para o ‘télos’ do progresso humano rumo à modernidade-capitalismo-socialismo (p. 9-10). * Coulthard defende uma mudança contextual (contextual shifting) como resposta para essa segunda questão, do paradigma da “relação-capital” para a “relação-colonial”. Em sua perspectiva, a questão do colonialismo em si era secundária para Marx, o que realmente lhe importava era demonstrar como a expropriação do trabalhador e sua transformação em operário fabril assalariado era um processo essencial para o capitalismo. A transição proposta por Coulthard é do capitalismo/homem branco assalariado na Europa para o sujeito colonizado e sua posição frente ao processo de

expropriação colonial (p. 10-11). (Autor defende que o próprio Marx chegou a começar a rever essas questões em sua última década de vida, apontando que as sociedades não-ocidentais não necessariamente precisariam passar pela etapa capitalista para alcançar formas de liberdade humana plena). * Lembra também que não só a terra indígena foi expropriada no Canadá, mas também a mão de obra indígena teve o seu trabalho massivamente explorado pelos colonos europeus (p. 12). * Ênfase do autor, ao abordar essas questões, é mostrar que a expropriação de terras é o caráter definitivo da acumulação primitiva de capital conforme vivida pelos nativos canadenses, e não a proletarização, processo enfatizado na abordagem original de Marx. Mais que isso, a expropriação segue sendo o eixo de dominação e resistência vivenciado pelos indígenas viventes no país (p. 13). Foco na terra, e não no trabalho: * “Stated bluntly, the theory and practice of Indigenous anticolonialism, including Indigenous anticapitalism, is best understood as a struggle primarily inspired by and oriented around the question of land— a struggle not only for land in the material sense, but also deeply informed by what the land as system of reciprocal relations and obligations can teach us about living our lives in relation to one another and the natural world in nondominating and nonexploitative terms—and less around our emergent status as “rightless proletarians.” (p. 13). * Nesse mesmo sentido, a nova ênfase ao marxismo proposta pelo autor também possibilita uma revisão da dimensão “ecológica” do pensamento de Marx, que em suas formulações originais vê o território como algo a ser submetido à ideologia do produtivismo e do “progresso” econômico. Olhar para o território desde uma perspectiva indígena pode ser favorável a uma ruptura com tal paradigma (p. 13-14). * Propõe também uma ruptura com o reducionismo econômico marxista, propondo a inclusão das dimensões racial, de gênero, estatal que compõem a constelação de relações de poder coloniais: “Although it is beyond question that the predatory nature of capitalism continues to play a vital role in facilitating the ongoing dispossession of Indigenous peoples in Canada, it is necessary to recognize that it only does so in relation to or in concert with axes of exploitation and domination configured along racial, gender, and state lines. Given the resilience of these equally devastating modalities of power, I argue that any strategy geared toward authentic decolonization must directly confront more than mere

economic relations; it has to account for the multifarious ways in which capitalism, patriarchy, white supremacy, and the totalizing character of state power interact with one another to form the constellation of power relations that sustain colonial patterns of behavior, structures, and relationships” (p. 14).

* (3) Marx vê a acumulação primitiva de capital como um processo inerentemente violento. Coulthard quer analisar o caso do Canadá, no qual as tentativas de expropriação não vêm mais por vias de violência direta, mas sim por tentativas de acomodação e “reconhecimento” de um Estado “multinacional” e de pluralismo liberal frente aos povos indígenas (p. 15).



Frantz Fanon e a Política de Reconhecimento em Contextos Coloniais

* Aqui, busca explicar como o domínio colonial expressamente na forma de dominação foi substituído por uma governamentalidade colonial oculta via processos estatais como o de reconhecimento e acomodação. Para tal tarefa, remonta ao trabalho anticolonial de Frantz Fanon (p. 15-16). * Mais especificamente seguindo o argumento do autor em Pele negra, máscaras brancas, Coulthard aponta que em situações nas quais o domínio colonial não é garantido apenas com o recurso ao uso da força, a hegemonia colonialista só pode ser mantida através da produção de um sujeito colonial, que absorva as formas de pensamento, desejo e comportamento favoráveis à perpetuação do domínio colonial (p. 16): * “Fanon’s analysis suggests that in contexts where colonial rule is not reproduced through force alone, the maintenance of settlerstate hegemony requires the production of what he liked to call “colonized subjects”: namely, the production of the specific modes of colonial thought, desire, and behavior that implicitly or explicitly commit the colonized to the types of practices and subject positions that are required for their continued domination” (p. 16). * Assim, ao contrário do que muitas abordagens sobre política identitária afirmam, o reconhecimento é para Fanon um novo “campo de poder através do qual as relações coloniais são produzidas e mantidas” (p. 17). 

Projeto do Livro

* Primeiro capítulo faz uma crítica à dialética mestre/escravo hegeliana a partir dos estudos de Fanon. Aponta para o reconhecimento como parte fundamental da constituição da subjetividade humana – identidade como um diálogo ou luta intersubjetivos com outros sujeitos. Indica ainda que nos processos de reconhecimento, “when delegated exchanges of recognition occur in real world contexts of domination the terms of accommodation usually end up being determined by and in the interests of the hegemonic partner in the relationship. This is the structural problem of colonial recognition identified by Fanon in Black Skin, White Masks” (p. 17). ---* Apresenta as controvérsias existentes dentro da própria esquerda a respeito das lutas por reconhecimento e às ‘políticas identitárias’ em geral, indicando que são particularistas e acabam por minar as possibilidades de uma luta universalista contra macrossistemas de opressão e por reivindicações gerais por igualdade, uma luta situada em termos de classe (p. 18). Por outro lado, outra parte da esquerda aponta que as lutas por reconhecimento enriquecem e complementam as lutas por redistribuição material, como indica o trabalho de Nancy Fraser (p. 18-19). Em suma: “In short, advocates of the left-materialist critique challenge the affirmative relationship drawn between recognition and freedom by many defenders of identity/difference politics on the grounds that such a politics has proven itself incapable of transforming the generative material conditions that so often work to foreclose the realization of self-determination in the lives of ordinary citizens” (p. 19, grifo meu). * Desde uma perspectiva indígena, Coulthard indica que em contextos de colonialismo (settler colonialism), as lutas por reconhecimento nunca são separadas das lutas por redistribuição de terras, poder político e recursos econômicos. Não se aplica a crítica da esquerda materialista de que as lutas culturais obliteram a estrutura econômica (p. 19). * Essa diferença também pode ser lida sob os marcos de Fraser, que aponta que as lutas sociais podem assumir caráter transformativo, orientado para as raízes profundas das desigualdades em âmbito econômico, político e social, ou afirmativo, que buscam atenuar as consequências de ‘segunda ordem’ dessas causas estruturais. Na opinião do autor, o enquadramento da luta por reconhecimento presente no Canadá contemporâneo representa uma mudança do paradigma transformativo para o afirmativo no histórico de lutas das Primeiras Nações (p. 19).

* Outro conjunto de críticas às políticas de reconhecimento é a de essencialismo, ou seja, a noção de existência de determinadas ‘essências’ da identidade negra, indígena, feminina, lgbt etc., ao invés de sua concepção como histórica, social e contextualmente construídas e mutáveis. Perspectiva é de que as concepções essencialistas seriam mais uma “camisa de força” para os ‘grupos identitários’ do que um caminho de liberdade para eles, posicionando outro importante desafio para as visões acríticas acerca da relação entre “reconhecimento” e “liberdade” (p. 20). * Novamente remontando a Fanon, Coulthard afirma que o ponto de seu argumento não é negar o “reconhecimento” como um todo, mas realocar o foco para práticas de autoreconhecimento entre os povos indígenas, como forma de empoderamento de si mesmos, ao invés de uma confiança excessiva nos processos de reconhecimento estatal (p. 23)....


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