Capítulo 115 (excerto) da Crónica de D. João I PDF

Title Capítulo 115 (excerto) da Crónica de D. João I
Author Magda Cardoso
Course INTRODUÇÃO À GESTÃO   
Institution Universidade do Algarve
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Capítulo 115 Per que guisa estava a cidade corregida para se defender, quando el-Rei de Castela pôs cerco sobre ela. […] Nom leixavom os da cidade, por serem assi cercados, de fazer a barvacãa1 d’arredor do muro da parte do arreal, des a porta de Santa Caterina, ataa torre d’Alvoro Paaez, que nom era ainda feita, que seriam dous tiros de besta; e as moças sem neuũ medo, apanhando pedra pelas herdades, cantavom altas vozes dizendo: Esta Lixboa prezada, mirá-la e leixá-la. Se quiserdes carneiro, qual derom ao Andeiro; se quiserdes cabrito, qual derom ao Bispo. e outras razões semelhantes. E quando os ẽmigos os torvar2 queriam, eram postos em aquel cuidado em que forom os filhos de Israel, quando Rei Serges, filho de rei Dario, deu licença ao profeta Neemias que refezesse os muros de Jerusalem, que guerreados pelos vezinhos d’arredor, que os nom alçassem3 , com ũa mão poinham a pedra, e na outra tinham a espada pera se defender; e os Portugueses fazendo tal obra, tinham as armas junto consigo, com que se defendiam dos ẽmigos quando se trabalhavom de os embargar4 , que a nom fezessem. As outras cousas que pertenciam ao regimento da cidade, todas eram postas em boa e igual ordenança; i nom havia nẽuũ que com outro levantasse arroido nem lhe empecesse per talentosos excessos5 , mas todos usavom d’amigavel concordia, acompanhada de proveito comuũ. Ó que fremosa cousa era de veer! Uũ tam alto e poderoso senhor como el-Rei de Castela, com tanta multidom de gentes assi per mar come per terra, postas em tam grande e boa ordenança, teer cercada tam nobre cidade! E ela assi guarnecida contra ele de gentes e d’armas com taes avisamentos6 por sua guarda e defensom! Em tanto que diziam os que o virom, que tam fremoso cerco de cidade nom era em memoria d’homeẽs que fosse visto de mui longos anos atá aquel tempo. NOTAS: (1) barvacãa: barbacã, muro com função de defesa das muralhas, um pouco menor que a parede da muralha. (2) torvar: atrapalhar, perturbar. (3) que os nom alçassem: para que não erguessem os muros. (4) embargar: impedir. (5) nem lhe empecesse per talentosos excessos: nem lhe causasse dano por atos intencionalmente desordeiros. (6) avisamentos: precauções.

CRÓNICA DE D. JOÃO I – FERNÃO LOPES Capítulos fulcrais para a afirmação da consciência coletiva: • Capítulo 11 – o povo vê no Mestre de Avis o seu herói • Capítulo 115 – esta é a Lisboa prezada • Capítulo 148 – a fome em Lisboa Género de texto - Crónica medieval - textos em que se registam acontecimentos históricos por ordem cronológica. Características inovadoras de Fernão Lopes: • Articulação entre a compilação de fontes e a investigação original e crítica;

• Dimensão interpretativa e estética; • Visão global e integradora de várias perspetivas. Afirmação da consciência coletiva: • crise política de 1383-1385 (período sem rei/período de tomada de consciência de liberdades e responsabilidades). • Povo: • Papel decisivo na fase de nomeação do Mestre (cap. 11). • Preparação para o cerco, de forma empenhada e valorosa (cap. 115). • Vivência da miséria associada à falta de mantimentos durante o cerco (cap. 148). Atores individuais e atores coletivos • Personagens históricas – Mestre de Avis, Álvaro Pais, D. Leonor, D. Nun’Álvares Pereira, entre outros. • Povo, massa anónima, a “arraia miúda”, a população das cidades, em especial a de Lisboa. Mesmo em caso de diálogo, são vozes, normalmente não identificadas, que saem da multidão, representando-a, ou dirigindo-se a outros companheiros. Estilo • Objetividade vs subjetividade • Objetividade presente no rigor da pormenorização (cf. Descrições pormenorizadas com valor descritivo e informativo). • Subjetividade: presente na apreciação crítica e emotiva dos factos relatados (interrogação retórica, frase exclamativa). “pensa alto, comenta, interpela” • Conjugação de planos – planos gerais (focalização da cidade e dos atores coletivos que nela intervêm) e planos de pormenor (incidência em grupos de personagens e/ou situações particulares). • Visualismo – recursos (comparação, personificação, enumeração, hipérbole) e vocábulos que marcam o sensorialismo da linguagem (atos de ver e ouvir). Uso da técnica da reportagem: o leitor "vê" e "sente" os acontecimentos, está no centro da ação. • Coloquialismo – recursos expressivos (interrogação retórica, apóstrofe) e interpelação do interlocutor, recorrendo à 2ª pessoa do plural. • Dinamismo – recriação dos acontecimentos de forma dinâmica. • Discurso direto e indireto, misturados, com períodos longos e curtos e alternados. A crise de 1383-1385 Em 1383, D. Fernando, rei de Portugal estava a morrer. Como descendentes deixava apenas a infanta D. Beatriz, a qual havia sido prometida a dois príncipes castelhanos, a um Inglês e a mais um castelhano: Fernando, filho de D. João I de Castela. No tratado de Salvaterra de Magos, o qual assinalava a paz com Castela, o seu casamento havia sido decidido por este último castelhano e o filho varão que nascesse herdaria o reino de Portugal. O povo português temia este acordo, pois se D. Beatriz falecesse antes de dar à luz um filho varão, Portugal perderia a sua independência. Começaram a surgir dois candidatos ao trono (meios-irmãos) e os seus apoiantes: • D. João, filho do Rei Pedro I de Portugal e D. Inês – acabou por ser preso; • João, Grão-Mestre de Avis, filho bastardo de D. Pedro I – filho de D. Teresa Lourenço, aia de Inês de Castro.

Quando o rei morre, a regência do reino é entregue a D. Leonor Teles, a rainha e os conflitos iniciam-se. D. João I, mestre de Avis, foi apoiado pelas tropas Inglesas e organizou uma reunião nas Cortes de Coimbra, onde acabou por ser eleito rei de Portugal. Esta situação levantou uma grande revolta por parte dos castelhanos. D. João I nomeou Nuno Álvares Pereira, Condestável de Portugal, para ser protetor do reino. Das lutas consta-se a batalha de Trancoso, o cerco de Lisboa e a batalha de Aljubarrota. Nesta última, o exército castelhano foi derrotado, praticamente aniquilado e o rei castelhano não voltou a tentar novas invasões nos anos seguintes. Com esta vitória, João I foi reconhecido como rei de Portugal, pondo um fim ao interregno e à anarquia da Crise de 1383-1385. O reconhecimento de Castela chegaria apenas em 1411 com a assinatura do tratado de Ayllón-Segovia. A aliança Luso-Inglesa seria renovada em 1386 no Tratado de Windsor e fortalecida com o casamento de João I com Filipa de Lencastre (filha de João de Gaunt). O tratado, que, ainda em vigor, vem a ser a mais antiga aliança do mundo, estabeleceu um pacto de mútua ajuda entre Inglaterra e Portugal. D. Leonor Teles e o Conde Andeiro Com a morte de Fernando em 22 de outubro de 1383, Leonor assumiu a regência do reino e o seu amante galego, João Fernandes Andeiro, passou a exercer uma influência decisiva na corte. Esta ligação e influência desagradavam ao povo e à burguesia e a alguma nobreza, que odiavam a regente e temiam ser governados por um soberano castelhano. D. João, Mestre de Avis, apoiado por um grupo de nobres, entre os quais Álvaro Pais e o jovem Nuno Álvares Pereira, foi incentivado pelo descontentamento geral a assassinar o conde Andeiro. A ação ocorreu no paço, a 6 de dezembro de 1383. Leonor abandonou Lisboa, fiel ao Mestre de Avis, e refugiou-se em Alenquer e depois em Santarém, cidades fiéis à causa da rainha, onde tentou manobrar politicamente a sua continuidade no poder. No entanto, com o desenvolver do conflito entre o Mestre de Avis e o rei castelhano, a regente perdeu espaço de manobra e acabou por ser constrangida a abdicar da regência a favor de João I de Castela e de Beatriz, sua filha, a esposa do rei castelhano. Com a vitória do partido do Mestre de Avis na guerra civil e contra Castela, este tornou-se regente e depois rei. D. João I de Castela, genro de Leonor, logo em 1384, pouco depois dela ter renunciado à regência, havia-a internado no Mosteiro de Tordesilhas, perto de Valhadolide, onde, segundo alguns historiadores, faleceu em 1386. No entanto, referências do cronista castelhano Lopez de Ayala, seu contemporâneo, dão-na como viva em 1390 e em data ainda mais tardia1 . Síntese da obra: • Glorificação da memória de D. João I; • Construção dos pilares da consciência nacional, através da criação de uma tradição histórica legitimadora, mediante a elaboração da História de Portugal desde os primórdios da humanidade. • Narração do reinado de D. João I, desde a sua aclamação (depois da morte do Conde Andeiro) até ao estabelecimento da paz com Castela. • Nesta obra existe uma afirmação da consciência coletiva Afirmação de D. João como Regedor e Defensor do reino e, posteriormente, como rei; Manifestação da coragem, do espírito de sacrifício e dos sentimentos de patriotismo da população durante a Guerra Civil com Castela.

A afirmação da consciência coletiva é um tópico central da Crónica de D. João I, de Fernão Lopes. Redige uma exposição sobre este tópico, utilizando entre 200 a 300 palavras. Ilustra a tua composição com dois exemplos significativos. A Crónica de D. João I de Fernão Lopes é o retrato vivo da importância do povo e da sua liderança para o futuro de uma nação. De facto, perante o contexto da crise de 1383/1385 e da iminência da perda da independência, foi a união do povo português e a sua consciência coletiva que permitiram segurar Portugal. Assim, gerou-se um sentimento de crise nacional que se disseminou em responsabilidades cívicas, ao nível dos direitos e dos deveres. Ora, o povo passou a ser um agente coletivo na tomada de decisões, nomeando o Mestre de Avis como seu líder e futuro rei de Portugal. Vejamos como exemplo o capítulo 11, em que, em uníssono, o povo socorreu o Mestre, perante a ameaça de ele poder ser morto pelo Conde Andeiro. A forma como o povo agiu, muitas vezes imponderadamente, demonstra o seu empenho na defesa de Portugal. Além disso, aquando da defesa do cerco de Lisboa, retratado no capítulo 115, verifica-se a importância da consciência coletiva do povo na defesa da cidade. Deste modo, sob comando do Mestre de Avis, o povo português foi capaz de passar por todo o tipo de sacrifícios em prol do bem comum. Em conclusão, quando o povo se une nada o detém: a sua missão deve ser do interesse de todos por igual. É o caso da defesa de Portugal, além da questão sempre maior: o patriotismo....


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