Relatório Piaget PDF

Title Relatório Piaget
Course Métodos Projetivos de Avaliação
Institution Universidade Federal do Ceará
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Summary

Descrição da experiência de realizar o experimento
piagetiano de Conservação de Quantidades como parte da disciplina de Métodos Clínicos de
Avaliação Cognitiva. Objetivou-se analisar como se deu a aplicação desse exame,
compreendendo como é possível perceber o estágio de desenvolvi...


Description

1 INTRODUÇÃO Este relatório tem por objetivo descrever a experiência de realizar o experimento piagetiano de Conservação de Quantidades como parte da disciplina de Métodos Clínicos de Avaliação Cognitiva. Além disso, objetiva analisar como se deu a aplicação desse exame, compreendendo como é possível perceber o estágio de desenvolvimento mental da criança através deste, tendo em vista suas características. Ao longo do relatório serão explicitados quais os procedimentos realizados na aplicação do teste, características da criança que realizou o experimento, quais os passos seguidos de acordo com o objetivo de realização da prova, um protocolo do momento do experimento, uma avaliação deste e a avaliação grupal de como foi realizar o experimento proposto. De acordo com Carraher (1994), o experimento de Conservação de Quantidades busca demonstrar como ideias consideradas óbvias ao raciocínio do indivíduo adulto são, na verdade, adquiridas no processo de desenvolvimento intelectual do sujeito, sem característica inata. No caso específico desse experimento, o que está sendo avaliado é a capacidade da criança, que normalmente ainda está no estágio pré-operatório, com idades entre dois e sete anos, de compreender ou não se duas quantidades, aparentemente distintas mas logicamente semelhantes, são as mesmas. Este exame se divide em dois tipos: contínuo e descontínuo. No experimento realizado, os dois tipos foram utilizados, começando pelo experimento descontínuo, utilizando o comprimento de fileiras, e em seguida o contínuo, em que se deveria avaliar a igualdade no nível da água. De forma geral, o experimento de Conservação de Quantidades se divide da seguinte forma: primeiramente, se organizam duas quantidades iguais, de forma que estas duas coincidam visualmente; em seguida, apesar das quantidades serem ainda as mesmas, elas devem ser organizadas de forma a serem perceptualmente diferentes, sendo tal mudança realizada na frente do sujeito; durante todo o experimento, é pedido à criança que explique a relação entre as duas quantidades (igualdade, mais, menos) e esclareça o por quê de tal afirmação; por fim, as quantidades são colocadas como cada vez mais diferentes visualmente falando, além de haver sempre uma contra-argumentação seja qual for a resposta da criança, tanto uma resposta “conservadora” quanto uma “não-conservadora” (CARRAHER, 1994).

Segundo Piaget (1999), a criança ainda em estágio pré-operatório procede sob o pensamento intuitivo, isto é, pensa guiada por sua percepção e por suas experiências sensório-motoras, sem ainda estabelecer operações lógicas e racionais que a possibilitem, por exemplo, compreender que quantidades, apesar de aparentemente diferentes, podem ser as mesmas. Além disso, crianças neste estágio não conseguem perceber as contradições em sua fala ou as contradições na fala dos outros, aceitando facilmente uma contra-argumentação e permanecendo com a mesma opinião, já que não consegue justificar suas afirmativas e, muitas vezes, apenas tenta usar a finalidade de algum objeto, por exemplo, como uma certa justificativa. É

importante

ressaltar,

primeiramente,

que

as

crianças

consideradas

não-conservadoras, ou seja, que não conseguem ir além da percepção para realizar uma operação lógica de entendimento, estão no estágio da gênese do pensamento. O começo desse estágio é marcado pela aquisição desse estágio, que, consequentemente, leva tanto à capacidade de socialização quanto à possibilidade de interiorização da linguagem e da ação, possibilitando o pensamento (PIAGET, 1999). A criança, então, se vê entre dois mundos distintos: o interior e o social. Assim, o sujeito ainda se encontra egocêntrico ao mesmo tempo em que se intercomunica, realizando monólogos e tendo conversas. Aqui, a criança ainda tem certa indiferenciação em relação ao outro, mostrando não entender que é possível que a opinião deste não seja a mesma que a sua, ou que seja possível que a outra pessoa não veja sobre seu mesmo ponto de vista. Por isso, é passível para a criança aceitar a contradição, assim como dito anteriormente, já que não há, para ela, qualquer discussão interna, pela crença de que há apenas uma forma de se perceber o mundo (PIAGET, 1999). Para além do que já foi mencionado, Piaget (1999) afirma que a criança adquire, após a linguagem, capacidades essenciais para que possa, conseguir conservar quantidades: a reconstituição do passado e o planejamento futuro. É necessário que possa lembrar e falar sobre a quantidade que tinha anteriormente para que possa pensar na quantidade futura, assim como é importante entender que mesmo com diferentes mudanças perceptivas, é possível prever que uma quantidade continuará a mesma, mesmo que se mude mais uma vez um líquido para outro copo, por exemplo. Em relação ao pensamento causal, crianças no estágio pré-operatório tem facilidade de dar explicações causais que sejam acessíveis a elas, buscando sempre a

finalidade dos fenômenos, estabelecendo uma relação com objetos de forma a entendê-los como animados, e estando ainda de forma artificial (PIAGET, 1999). Em suma, todas essas características aparecem ao longo dos 5 anos de estágio pré-operatório, de forma que vão aos poucos surgindo operações lógicas, e se aperfeiçoando de forma gradual. Assim, é imprescindível entendermos, ao analisar e realizar um exame piagetiano, o desenvolvimento mental dessa criança, entendendo que as características mudam e se afastam ou se aproximam cada vez mais do pensamento lógico. Considerando todas essas questões e conceitos necessários para análise do conteúdo do experimento, e buscando seguir todas as instruções, foi-se realizado o experimento de conservação de quantidades pela equipe.

2 METODOLOGIA O exame piagetiano anteriormente descrito foi realizado com uma menina de 6 anos chamada Emily. Emily frequenta a escola e atualmente está no 1º ano do ensino fundamental. O experimento foi realizado em sua casa, por volta das 15:00, no sábado, dia 02 de novembro de 2018. Para a realização do experimento utilizamos peças de dominó, a fim de realizar o exame do tipo descontínuo, e dois copos de mesmo tamanho, dois de tamanhos diferentes e uma jarra com água para realização do experimento de tipo contínuo. Como dito anteriormente, começamos pelo experimento do tipo descontínuo e em seguida passamos ao experimento do tipo contínuo. Perguntamos a Emily se poderíamos filmar e gravar o áudio do experimento utilizando dois aparelhos celulares para que pudéssemos, após a realização do experimento, avaliar seu conteúdo. O pedido foi consentido.

2.1 PROTOCOLO 2.1.1 EXPERIMENTO DE CONSERVAÇÃO DE QUANTIDADES DESCONTÍNUAS Experimentadora: Emily, ó. Olha pra tia. Vamos começar? Vou te explicar, tá bom? Presta atenção na titia. Deixa aí. Emily mexe no celular que estava gravando o áudio. Experimentadora: Eu vou pegar umas coisas aqui, esses dominós, tá vendo? Emily: Aham. UAAA (Emily grita em direção ao celular que estava gravando o áudio).

Experimentadora: Presta atenção. Aí, tu vai dividir igual, do mesmo tanto pra mim e pra ti. Do mesmo tanto. O mesmo tanto que tu botar pra mim, tu bota pra ti. Emily: Tá quebrado. Experimentadora: Pois tira esse. Pode ser esse? Emily: Sim. Experimentadora: Aí, vai. Divide igual, do mesmo tanto, pra mim e pra ti. Emily: 1...1, 2...2, 3...3, 4...4, 5...5 (Emily conta enquanto distribui as peças de dominó). Experimentadora: Pronto? Deixa eu fazer assim. (Experimentadora distribui as peças em duas fileiras de cinco). Emily: Não, assim (Emily coloca uma das peças de dominó no outro sentido). Experimentadora: Não, pode deixar assim. Emily: Pra quê? Experimentadora: Só pra ficar. Então, tá do mesmo tanto pra mim e do mesmo tanto pra ti? Emily acena com a cabeça. Experimentadora: Tá? Pois vamos contar pra gente ter certeza. Emily conta as peças de sua fileira. Experimentadora: Cinco pra Emily. Emily conta as peças da fileira da Experimentadora. Experimentadora: Cinco pra tia Nessa, né? Pronto. Emily: Você é psóliga? Experimentadora ri. Experimentadora: Sou estudante de Psicologia, Emily. Ó, vem cá. Tá igual, né? Tá do mesmo tanto? Emily acena com a cabeça. Experimentadora: E se eu fizer assim, ó? (Experimentadora afasta as peças de sua fileira, tornando-a mais comprida). A gente tem o mesmo tanto? Emily: Tem. Experimentadora: Tem? Por quê? Emily: Porque, ó… (Emily distribui sua fileira de modo a torná-la tão comprida quanto a da Experimentadora). Tem a mesma quantidade. Experimentadora: É a mesma, é? Emily acena com a cabeça.

Emily: Mesma quantidade de dominós. Experimentadora: É a mesma, pra mim e pra ti? Hum, entendi. Emily: Se a senhora tirar um, fica quatro. Experimentadora: Se eu tirar um fica quatro? Emily acena com a cabeça. Experimentadora: Tá certo. Então desse jeito aqui tá do mesmo tanto? Emily acena com a cabeça. Experimentadora junta as peças da Emily, deixando a fileira mais curta. Experimentadora: E desse jeito aqui, ó? Emily: Também. Experimentadora: Tem o mesmo tanto? Emily: Uhum. Experimentadora: É. Emily acena com a cabeça. Experimentadora: E se eu fizer assim? (Experimentadora coloca as peças uma em cima da outra, formando uma pequena torre). Emily: Ainda. Experimentadora: Tá do mesmo tanto? Emily acena com a cabeça. Experimentadora: E aqui? E assim? Tá do mesmo tanto? (Experimentadora coloca uma das mãos sobre o pequena torre). Emily: Uhum. Experimentadora: Como é que tu sabe? Se tá coberto, como é que tu sabe? Emily observa a mão da Experimentadora. Experimentadora: Quanto é que tem aqui? Emily: Cinco. Experimentadora: Como é que tu sabe? Emily: Porque eu vejo nos buraquinhos. Experimentadora: Ah, tá. E se tu não ver nada? Assim. (Experimentadora coloca a outra mão para cobrir tudo). Emily: Ainda consigo ver. Experimentadora: É? Por quê?

Emily: Porque o meu fantasma olha por aqui. Experimentadora ri. Emily: E ainda continuo viva. (Emily ri). Experimentadora: Mas tá do mesmo tanto porque tu contou, foi? Porque tu contou antes? Emily: Foi, foi, foi, foi. Pois é, pois é, pois é. Experimentadora: Ah, tá bom, então. Pois vamos contar de novo? Experimentadora coloca novamente as peças em uma fileira mais comprida que a de Emily. Experimentadora: Desse jeito aqui, tá do mesmo tanto? Emily: Sim. Experimentadora deixa sua fileira novamente novamente do mesmo comprimento que a de Emily. Experimentadora: Assim também? Emily: Sim. Experimentadora coloca as peças em uma pequena torre. Experimentadora: E assim? Emily: Sim. Experimentadora: Também? Emily acena com a cabeça. Experimentadora: Tá bom, então. Vamos fazer outro, então.

2.1.2 EXPERIMENTO DE CONSERVAÇÃO DE QUANTIDADES CONTÍNUAS Experimentadora: Ó, não… Peraí. Emily: Me dá. Experimentadora: Peraí, vou te explicar, aí a gente faz, certo? Ó, vamo fazer assim, ó. Esses dois copos aqui, tá? E essa água. Divide igual pra mim e pra ti, a gente tem que beber o mesmo tanto, vai, igual. Se tu quiser que eu bote, tu me diga ou tu bota? Assim, ó. Bota mais… tá bom. Agora bota esse aqui o mesmo tanto, tá bom. Ó, vou dividir, tá bom? Porque tem muito. Tá do mesmo tanto? Emily: Acho que sim. Experimentadora: Ó, olha aí direitinho se tá do mesmo tanto. Emily: Tá.

Experimentadora: Tá igual? Emily: Tá. Experimentadora: Mesmo tanto, pra mim e pra ti? Emily: Uhum. Experimentadora: Tá, então a gente vai beber a mesma quantidade, se a gente beber nesse copo aqui, né? Esse aqui é teu e esse aqui é meu, pera aí. A gente vai beber o mesmo tanto? Vai? Sim ou não? Emily: Uhum. Experimentadora: Sim? Tá bom. Mas eu não quero beber nesse copo, Emily. Eu vou beber nesse daqui, ó. Emily: Ainda fica o mesmo tanto? Experimentadora: Tu acha que ainda tá do mesmo tanto? Emily: Não. Experimentadora: Por que? Emily: Sei lá. Experimentadora: Qual que tem mais? Emily: É alto. Experimentadora: Esse aqui é alto, mas tem o mesmo tanto dentro? Emily: Eu acho que sim. Experimentadora: Por que? Emily: Sei lá. Experimentadora: Vamo, tenta… tenta responder pra tia. Tu acha que aqui é o mesmo tanto? Emily: Sim. Experimentadora: Sim. Por que? Emily: É porque… Num sei lá. Experimentadora: Tenta, mulher. Ó, eu vou passar desse copo aqui, ó. Tá vendo, né? Pra esse. Emily: Fica o mesmo tanto. Experimentadora: Fica o mesmo tanto? É? Emily acena que sim

Experimentadora: E esse aqui eu vou passar, ó. O mesmo tanto que tem aqui eu vou passando pra esse copo, tá vendo? Emily: Então é o mesmo tanto. Experimentadora: É o mesmo tanto? Emily: Ó. Emily pega o copo mais baixo e nivela com o mais alto. Experimentadora: É? Mas esse aqui, ó, num tá mais alto que esse? Emily: Tá. Experimentadora: Então é o mesmo tanto? Continua o mesmo tanto? Emily acena que sim. Experimentadora: Mesmo que esse aqui pareça mais alto, é? Emily concorda com a cabeça. Experimentadora: Eu acho que esse aqui tem mais, tem não? Emily acena que não com a cabeça. Experimentadora: Não? Pois vamo ver aqui, ó. Eu vou passar desse daqui pra esse. Tu tá vendo, né? Emily: Uhum. NHINOOOM. Experimentadora: Tá igual? Emily: Tá. Experimentadora: E tá, então, tu... tu quer beber nesse copo aqui? Emily acena que sim. Experimentadora: Pois vou passar pra ele, ó. O teu, ó. Tá vendo? Emily acena novamente. Experimentadora: Vou passar pra esse copo aqui. E agora? Tá o mesmo tanto? Emily pega os copos e os encosta para ver melhor. Emily: Ainda tá. Experimentadora: Tá o mesmo tanto? Emily: Tá. Experimentadora: Por que? Emily dá de ombros. Experimentadora ri. Emily: Tu não sabe por que? Emily acena que não.

Experimentadora: Mas ó, se esse aqui, ó. Quando tá nesse copo aqui. É o mesmo tanto ou não é? Emily: É. Experimentadora: E quando eu passar pra esse? Emily: Ainda é o mesmo tanto. Experimentadora: É o mesmo tanto? Emily acena que sim. Experimentadora: E nesse? Emily: Ainda é o mesmo tanto. Experimentadora: É o mesmo tanto? Emily acena que sim. Experimentadora: Tem certeza? Emily: Uhum. Experimentadora: Mesmo que o tamanho teja diferente. Emily: É. Experimentadora: É? Emily: Mesmo tanto. Experimentadora: Tá bom, então. 3 DESENVOLVIMENTO O experimento de conservação de quantidades durou cerca de 6 minutos, sendo 3 minutos para cada tipo de exame (descontínuo e contínuo). Como dito anteriormente, iniciamos com o exame do tipo descontínuo, em que se utilizou das peças do dominó para sua realização. Emily distribuiu igualitariamente as peças entre ela e a examinadora, cinco para cada, apoiando-se na fala para realizar a contagem. Após isso, a experimentadora organizou-as em fileiras e conferiu novamente com Emily se havia a mesma quantidade de peças para as duas, para que assim se desse início ao processo de transformação e contra-argumentação. Vale ressaltar aqui que, como a professora apontou na apresentação do vídeo em sala de aula, o ideal teria sido que a criança mesma tivesse organizado as peças nas fileiras. A examinadora, aumentando o intervalo do espaço entre as fichas da sua fileira, questionou Emily se ainda teria a mesma quantidade de peças para cada uma. Esta respondeu

que sim e distribuiu as fichas de sua fileira, tornando-a tão comprida quanto a outra, de modo a realizar uma correspondência termo a termo para comprovar sua resposta. Afirmou ainda que se a examinadora retirasse uma das peças de sua fileira, restariam apenas quatro fichas. As respostas de Emily, apesar das variações empregadas pela examinadora, como espaçar apenas uma fileira de peça, juntá-las uma em cima da outra (como uma torre) ou cobri-las com as mãos, se mantiveram firmes, permanecendo a afirmar que a distribuição ainda era a mesma entre ela e a experimentadora. Destaca-se que poderiam ter sido feitas mais contra-argumentações, como a professora Veriana nos atentou, a fim de tensionar o raciocínio da criança e melhor compreendê-lo Evidenciamos que Emily já conserva a igualdade entre os termos por correspondência lógica, havendo uma operação racional, conforme Piaget (1999) a conceitua, uma vez que suas respostas se deram a partir de uma análise das relações. A examinada não se utiliza da simples intuição, pois não avalia apenas o espaço ocupado, “isto é, pelas qualidades perceptuais globais da coleção focalizada” (PIAGET, 1999, p. 35). De acordo com Piaget (1999), no pensamento intuitivo que perpassa a primeira infância o sujeito afirma sem nunca demonstrar, havendo uma carência de provas, sendo esta uma das características próprias desse período, em que prevalece o egocentrismo. Nesse sentido, Emily afasta-se do pensamento intuitivo ao buscar justificativas para demonstrar sua afirmação, como fez ao espaçar a sua fileira para declarar que ainda tinha as mesmas quantidades de peças para ambas pessoas. O exame do tipo contínuo, em que nos utilizamos de quatro copos (2 semelhantes entre si e 2 diferentes) e uma jarra com água, iniciou-se com Emily distribuindo a água entre os dois copos semelhantes, com o auxílio da examinadora, de modo que houvesse a mesma quantidade nos dois. Após a transferência da água de um dos copos semelhantes para um dos copos diferentes, o qual tinha menor diâmetro e maior altura, Emily foi questionada se a quantidade de água permanecia a mesma nos dois recipientes. Ela responde, primeiramente, que não há a mesma quantidade, embora não saiba justificar o porquê, apenas afirmando que o segundo copo é alto. No entanto, quando a experimentadora diz “Esse aqui é alto, mas tem o mesmo tanto dentro?”, Emily responde que acha que tem sim, sem ainda saber justificar. A experimentadora realizou diversas transferências de água entre os diferentes copos disponíveis, dizendo que iria “passar o mesmo tanto” de um para o outro, assim como fez contra-argumentações como “É? Mas esse aqui, ó, num tá mais alto que esse?”. A criança,

no entanto, manteve sua resposta de que havia o mesmo tanto todas as vezes, embora permanecesse sem saber explicar. Constatou-se, então, que embora Emily não saiba justificar sua resposta de que a quantidade da água se conserva nos diferentes copos, ela se distancia do sujeito pré-operacional ao mudar sua resposta inicial de que havia mudado a quantidade de água na primeira transferência. A partir da contra-argumentação da examinadora, a criança percebe que as diferenças perceptuais de altura não implicam na quantidade de água, apesar de não compreender racionalmente isso por completo, uma vez que não sabe explicar, mas ela entende que há nos dois copos o mesmo tanto. O pensamento do pré-operatório, segundo Carraher (1994), caracteriza-se pela não execução das ações no plano mental, de modo que o estado inicial (que precede a ação) e o estado final não podem coexistir, ou seja, não poderia haver a mesma água simultaneamente nos dois copos diferentes. Admite-se, no máximo, o retorno empírico. Desse modo, a relação entre as ações é de sequência temporal, dependendo dos estados da realidade, sendo, portanto, um pensamento sem mobilidade (CARRAHER, 1994). Quando o pensamento da criança alcança o estágio das operações concretas, ela passa a executar as operações mentalmente, compreendendo o caráter reversível delas (CARRAHER, 1994). Assim sendo, faz-se possível considerar a mesma quantidade de água em dois copos distintos, já que as transformações não se dão mais como sequência temporal, mas como “uma relação entre possibilidades de ação que coexistem, ou seja, qualquer uma das ações poderia ser executada mentalmente num determinado momento” (CARRAHER, 1994), estando o copo com água ou não. Emily,

então,

aproxima-se

do

pensamento

operatório

ao

considerar

simultaneamente as situações que precedem e resultam das ações realizadas pela examinadora, de modo a afirmar que as quantidades nos recipientes distintos entre si são iguais, embora pareçam diferentes. Por fim, faz-se importante destacar o vínculo que havia entre a examinadora e a criança, contribuindo para que o experimento tenha sido realizado de uma forma mais descontraída, com conotação de brincadeira. Esse aspecto também se mostrou relevante para que a criança permanecesse envolvida e sem muitas distrações, possibilitando uma melhor compreensão do raciocínio da criança por não haver muitas interrupções no processo.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...


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