As raízes da destruição da tradição cristã no Ocidente PDF

Title As raízes da destruição da tradição cristã no Ocidente
Author M. Soares de Azevedo
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As raízes da destruição da tradição cristã no Ocidente i Mateus Soares de Azevedo

Após a crucifixão de Jesus Cristo, a religião cristã foi pouco a pouco se enraizando e se estabelecendo na Europa e no Oriente Próximo, sobretudo, mas também na Ásia e na África. Depois de vários séculos, alcançou seu apogeu naquilo que hoje chamamos de Idade Média – grosso modo, entre os anos 800 (coroação de Carlos Magno) e 1300. Floresceram nesta época confrarias espirituais como a franciscana e a dominicana; escolas de pensamento como a tomista (aristotélica) e a eckhartiana (platônica); movimentos artísticos como o românico e o gótico; sábios e santos como Francisco de Assis, Catarina de Siena, Alberto Magno e Dante. Sem falar dos hospitais, universidades e asilos criados pela igreja. Depois deste ápice, três revoluções modificaram a face da Cristandade. A primeira foi o Renascimento (século XV); a segunda, o Iluminismo (século XVIII); e a terceira, o concílio Vaticano II (1962-65). A Renascença foi o primeiro movimento de afastamento do divino rumo ao humanismo. O Iluminismo foi uma continuação disso, de uma maneira mais marcada e explícita. O Vaticano II foi a derradeira e mais devastadoras dessas revoluções, virando pelo avesso as principais crenças e práticas do Catolicismo. O concílio, assim, reforçou, de forma agressiva e destrutiva, e de dentro da própria cidadela da religião, as duas revoluções anteriores. A própria denominação daquilo que estamos indicando como a ‘primeira’ das revoluções é enganosa, pois significou a ‘morte’, não o ‘renascimento’, do patrimônio intelectual, espiritual e cultural medieval. Este legado inclui a especulação teológica de séculos, como exposto na Suma de Santo Tomás de Aquino; a Divina Comédia de Dante, compreendendo uma visão e um ensinamento sobre o destino póstumo do homem; a altamente espiritual arte e arquitetura românica e gótica; os ícones bizantinos, e muitos outros elementos. A Renascença foi o primeiro movimento de afastamento da espiritualidade, transcendência, qualidade, interioridade e verticalidade, rumo a uma nova ênfase na materialidade, mundanidade, quantidade, exterioridade e horizontalidade. Sem esquecer a substituição do 1

universalismo pelo individualismo, da intelectualidade pelo racionalismo. Em uma palavra, a Renascença significou o início do “reino da quantidade”, como magistralmente explicado por René Guénon em seus clássicos A Crise do Mundo Moderno e O Reino da quantidade e os sinais dos tempos. Três séculos após a Renascença, aconteceu uma segunda revolução, que traiu seu verdadeiro propósito pelo próprio nome; os líderes do auto-denominado “Iluminismo” viam a si mesmos como portadores da “luz” da ciência e da razão, contra as “trevas” da “superstição” e do “dogma”. Foi , assim, uma batalha ideológica contra a religião. Caracteristicamente, o movimento foi disseminado pela já secularizada e antitradicional maçonaria e serviu como base ideológica da Revolução Francesa. A redução da qualidade à quantidade, da espiritualidade ao materialismo, da interioridade à exterioridade experimentou assim um segundo estágio e representou uma radicalização dessas tendências que foi muito além da Renascença. Este “reino da quantidade”, que deu seus primeiros passos na Renascença e se expandiu no Iluminismo, alcançou a cidadela da religião com o concílio Vaticano II de 1962-65. O concílio permitiu que a nova ideologia humanista do “progresso”, da ciência e tecnologia invadisse os sacros limites antes reservados para o conhecimento e o amor de Deus. Mas, desde que a religião nunca pode ser um suporte para a mentalidade materialista como estruturada pela Renascença e o Iluminismo, e de fato está em completa oposição a ela, os chefes do concílio buscaram um pacto e uma acomodação com a mentalidade moderna. Tal meta constitui, contudo, uma clara traição do espírito cristão. Muito antes do Vaticano II, ainda na década de 1920, Guénon escreveu: Qualquer compromisso entre o espírito religioso e a mentalidade moderna enfraqueceria o primeiro e só beneficiaria a segunda, cuja hostilidade não seria por isso diminuída, dado que o modernismo almeja a aniquilação total de tudo que, na humanidade, reflete uma realidade superior a ela mesma (“A Crise do Mundo moderno”). Palavras proféticas. O principal arquiteto desta revolução dentro da igreja foi o jesuíta francês Teilhard de Chardin; ele foi o ‘elo perdido’ entre o Renascimento, o Iluminismo e o Vaticano II. Com seu evolucionismo panteísta com verniz cristão, Teilhard dizia que Cristo representou um 2

grande “salto evolutivo” e que Deus também está sujeito à “evolução”! Seu ‘testamento intelectual’ pode ser resumido num extrato de seu livro Cristianismo e Evolução (p.99): "Se, como resultado de alguma revolução interior, eu perdesse sucessivamente minha fé em Cristo, minha fé no Deus pessoal e a fé no espírito, creio que continuaria a crer de forma invencível no mundo. O mundo, seu valor, sua bondade, sua infalibilidade, é isso, ao final das contas, a primeira, a última e a única coisa em que creio.” Não é sem razão que um comentário espirituoso diz que se Lutero foi um cristão que deixou a Igreja, Teilhard foi um pagão que permaneceu nela! Juntamente com o espectro de Teilhard, podemos dizer que nossa época ainda é dominada pelos espectros de Darwin, Marx, Freud e Jung. Alguns deles, ou todos, podem ser já considerados “história”. Mas sua influência, percebida ou não, deixou marcas profundas em nosso modo de pensar e agir. Os “ismos” que forjaram continuam sendo as peças básicas de nossa “religião” secular. Esta também tem seus defensores “fundamentalistas”, que praticam uma “intolerância religiosa” que nada fica a dever aos piores exemplos do passado. E ai de quem ouse questionar seus “dogmas”! Pouquíssimas pessoas e instituições não foram afetadas por tais ideias. Em razão de sua influência no mundo ocidental, vale a pena avaliar como afetaram a Igreja Católica. Elas o fizeram especialmente mediante a revolução que foi o concílio Vaticano II. A natureza desta revolução pode ser apreciada pelos ditos e escritos dos papas do período, de João 23 a Bento 16 e Francisco. Através deles, percebe-se um programa radical e sem precedentes de rompimento com a tradição. Apesar disso, não suscitou grandes indagações por parte de um público que permanece relativamente passivo. As citações abaixo de Paulo 6º mostram claramente quão drástica foi a revolução. Suas palavras estão em contradição com os próprios fundamentos do Cristianismo.

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Giovanni Battista Montini (Paulo 6º - 1963-78)

Na audiência geral de 2 Julho de 1969, Montini declarou: “Se o mundo muda, não deveria a religião mudar também?” Ao abrir a 4ª sessão do Vaticano II, em 14 de setembro de 1965, ele disse à assembléia reunida: “Pode a igreja, podemos nós mesmos, fazer outra coisa senão olhar para o mundo e amálo?” É no seu pronunciamento de encerramento do concílio, em 7 de dezembro de 1965, que chegamos ao cerne da questão: “Uma corrente de amor e admiração fluiu do concílio para o mundo moderno… os valores do mundo foram não apenas respeitados, mas honrados, seus esforços foram aprovados, suas aspirações purificadas e abençoadas.” Foi neste mesmo pronunciamento que, com particular eloqüência, Montini nos legou o cerne de sua visão: “Todas as riquezas doutrinais do concílio não têm senão um propósito: servir ao homem… Reconheçam pelo menos isso, vós humanistas modernos que renunciaram à transcendência das coisas supremas, pelo menos este mérito e saibam reconhecer nosso novo humanismo: Nós também, Nós mais do que ninguém, também temos o Culto do Homem!”

Karol Józef Wojtyła (João Paulo 2º - 1978-2005) O pontífice que sucedeu Giovanni Battista Montini (Paulo 6) foi João Paulo 1º, o “papa sorriso” do marketing conciliar; ele governou por apenas 33 dias. Mas legou ao seu sucessor 4

um nome que já é todo um programa. De fato, João vem do “precursor” do concílio, Luciano Roncalli (João 23, que governou a Igreja de 1958 a 63) , e Paulo de seu “finalizador”, Montini, mas o polonês Karol Wojtyla foi além. Foi o responsável pela manutenção das transformações feitas durante o concílio e o imediato pós-concílio. Nesse sentido, pode-se dizer que teve um papel comparável ao de Napoleão após a Revolução Francesa, ao impedir a implosão do aggiornamento com o caos e a divisão que se formaram e a volta do Ancien Régime católico tradicional. Wojtyla foi o papa da imagem, dos eventos externos, das viagens. Mas não teve nenhum êxito no enfrentamento da desespiritualização das sociedades contemporâneas, agudizada, não por acaso, desde o concílio. Além disso, durante os quase 27 anos de seu pontificado, as divisões internas do Catolicismo moderno só aumentaram. De fato, todo o “carisma“ de Karol Wojtyla não foi capaz de colocar um fim à trágica crise que se abateu sobre a igreja desde os anos 1960. Dezenas de milhares de padres abandonaram o sacerdócio. Segundo a revista italiana Civiltá Cattolica (de 21 de abril de 2007), 69.063 padres abandonaram o sacerdócio entre 1964 e 2004. As vocações escasseiam tanto entre o clero secular como entre as ordens religiosas. Por todo o mundo, seminários, escolas e conventos foram fechados. Nos EUA, dos 49 mil seminaristas existentes em 1965, restaram hoje apenas 4.700. O número de freiras despencou de 180 mil, em 1965, para 75 mil em 2002. Os colégios católicos estadunidenses eram 1.566 em 1965; hoje são 786. Os estudantes nestas escolas caíram de 700 mil para 386 mil no mesmo período. A freqüência à missa caiu para menos de 20%, quando era de 75% em 1960. No Brasil, "o maior país católico do mundo", a Igreja perde cerca de um milhão de fiéis ao ano. Pesquisa Datafolha mostra que, entre 1997 (após a terceira visita apostólica de João Paulo 2 ao Brasil) e 2007, ano da visita de Bento 16, o número de católicos caiu de 74% para 64%. Isso representa cerca de 15 milhões de almas que abandonaram a barca de Pedro. No mesmo período, o número de ateus e agnósticos mais que decuplicou, de 0,5% para 7,4%. Na Europa Ocidental, metade dos recém-nascidos não é mais batizada na Igreja. Em contraste, as igrejas cristãs orientais, que não tiveram nenhum aggiornamento, não experimentam esta aguda crise e seguem em seu caminho normal tradicional.

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"Pelos frutos se conhece a árvore", ensina o Evangelho. Karol Jozef Wojtyla foi escolhido como o 263º sucessor de São Pedro em outubro de 1978. Ele nasceu em 18 de maio de 1920 na pequena cidade medieval de Wadovice, na Polônia. Em 1946, com 26 anos, foi ordenado sacerdote; em 1958, foi feito bispo; em 1964, arcebispo; em 1967, cardeal. Em 1978, sumo pontífice. Uma carreira fulminante. O primeiro não-italiano a ocupar o papado em quase 500 anos. Ator semi-profissional, admirador da filosofia existencialista, amante das caminhadas, do esqui e da canoagem, operário na Polônia por curta temporada. Os elementos inusitados em sua biografia são muitos. Durante a II Grande Guerra, ele e seu grupo teatral sofreram influência da “antroposofia” do austríaco Rudolf Steiner (1861-1925). Este movimento constitui uma cisão da “Sociedade Teosófica”, a qual sustenta ser uma “síntese superior” de todas as religiões. Em O Tesosofismo, História de uma Pseudo-Religião, René Guénon diz que o “antroposofismo” constitui um confuso e sincrético amálgama de idéias reencarnacionistas, pseudo-científicas e pseudo-cristãs. Outro admirador de Steiner foi o jovem Ângelo Roncalli, o qual, a partir de 1959, governaria a Igreja sob o nome de João XXIII (quando professor do Angelicum de Roma, Roncalli perdeu seu posto por ensinar as exóticas teorias de Steiner). Neste período, a grande paixão de Wojtyla foi indubitavelmente o teatro. Ele foi autor de um livro dedicado ao assunto, The Acting Person. Sua tradutora resumiu seu "complexo pensamento": "Enfatiza o valor irredutível da pessoa humana, vê uma dimensão espiritual na interação humana, o que leva a uma concepção profundamente humanista ." Os críticos teatrais, contudo, consideraram The Acting Person "entediante". Quanto à filosofia de João Paulo 2, ela é composta de ideias personalistas e existencialistas, com conceitos derivados de Heidegger, Husserl e Scheler. Outras importantes influências são os franceses Jacques Maritain -- cujo sonho era unificar as comemorações da Queda da Bastilha com as de Santa Joana D'Arc! -- e Teilhard de Chardin, sempre ele!, que tentou combinar numa mesma visão Cristianismo, evolucionismo darwinista e marxismo. No seu livro O Signo da Contradição, João Paulo II compara as intuições de Teilhard às do livro do Gênesis!

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Participante ativo do Concílio Vaticano II, a contribuição de Wojtyla foi "decisiva" – pelo menos segundo a biografia oficial -- para a redação da Constituição pastoral Gaudium et Spes (sobre a Igreja no mundo contemporâneo). Este documento, no entanto, foi considerado, pelo cardeal Heenan, antigo primaz da Inglaterra, como "uma duvidosa acomodação com tudo que está na base dos males que afetam a humanidade.” Contrariamente a todos os concílios anteriores, sua convocação foi feita essencialmente em resposta a motivações ideológicas e políticas, e não para encaminhar questões teológicas, como bem mostra Rama Coomaraswamy no presente livro. A excepcionalidade do concílio resulta, assim, como já notara Frithjof Schuon, do fato de que foi determinado não por situações concretas avaliadas a partir da teologia, mas por abstrações ideológicas opostas a esta última. Laborem Exercens, sua terceira encíclica, abordou a questão do trabalho. Nela, vale-se da linguagem ambígua tão bem explorada pelos textos do Vaticano II que se torna difícil de entender. Ursula Oxford conta a história de um jornalista americano que perguntou aos responsáveis do Vaticano como poderia analisar determinada greve à luz do texto. A declaração oficial foi de que "não há uma resposta específica, ou, para colocá-lo mais precisamente, pode-se analisá-la da maneira que a pessoa quiser". Em Laborem Exercens, apesar do estilo vago e ambíguo de sempre, João Paulo 2º esposou uma tendência mais ou menos socialista e condenou o capitalismo. Para ele, a "tradição cristã nunca sustentou que o direito à propriedade privada é absoluto e intocável". Na verdade, a Igreja sempre ensinou que o homem tem direito à propriedade privada, como observa Leão 13 na Rerum Novarum. Apesar de todo seu alardeado conhecimento do comunismo, João Paulo 2º pareceu esquecer-se do fato que, sem propriedade privada, o homem não passa de escravo nas mãos do Estado todo-poderoso. Laborem Exercens fala de "socialização satisfatória", sem nunca definir com clareza o que entende por isso. Com seus antecessores imediatos, ele nunca condenou claramente o comunismo, isto é, até a Centésimo Ano, em que apresenta uma visão mais otimista do sistema de mercado, o que assinala aliás uma mudança em relação às encíclicas sociais anteriores. Os homens do Vaticano II nunca esclareceram que há uma doutrina econômica 7

especificamente cristã, que defende a mais ampla distribuição da propriedade e critica os excessos do liberalismo e a concentração da riqueza. De outro lado, o comunismo foi condenado em mais de duas centenas de documentos da igreja tradicional. Pio 11, por exemplo, considerou-o "intrinsecamente perverso" e "contrário à própria lei natural", "um pseudo-ideal de justiça, igualdade e fraternidade". Outro exemplo de ambigüidade é a segunda encíclica de João Paulo 2º, Dives in Misericórdia, de 1979. Escreve ele: "A igreja afirma-se e realiza-se de uma maneira teocêntrica, mas em si mesma a igreja está centrada no homem... ela é antropocêntrica". Ou, na audiência geral de 29 de novembro de 1980, onde se percebe um eco das teorias de Rudolf Steiner: "O Cristianismo é antropocêntrico precisamente porque é plenamente teocêntrico, e ele é teocêntrico graças ao seu especial antropocentrismo". O leitor inteligente saberá decifrar o significado das frases... A despeito da grave crise, Wojtyla recusou-se a questionar a linha traçada por seus antecessores imediatos. Acompanhado do setor dominante na hierarquia eclesiástica, ele pareceu crer que a igreja, depois de séculos de balbucios e tartamudeios, subitamente nasceu numa manhã de 1962. Em sua primeira encíclica, expressa "seu amor pela herança única deixada à Igreja por João 23 e Paulo 6º" e sua "disposição em desenvolver este legado". Inúmeras foram as vezes em que afirmou que "realizar os ensinamentos do Vaticano II" seria a chave do seu governo.

Joseph Ratzinger (Bento 16 – 2005-2013) Concílio este que foi analisado nas seguintes palavras pelo então principal teólogo e segundo homem da hierarquia, o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Joseph Ratzinger, depois Bento 16: "O papas esperavam uma nova unidade, mas o que ocorreu foram contendas e dissensões de tais proporções que a Igreja parece estar passando da autocrítica para a autodestruição. Esperávamos um novo entusiasmo, mas acabamos, pelo contrário, no tédio e no desencorajamento. Olhávamos para um salto rumo ao futuro, mas o que encontramos, ao contrário, é um crescente processo de decadência que em grande medida

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desenvolveu-se a partir do --- e pode ser imputado ao -- assim chamado espírito do concílio" (Entrevista sobre a Fé, Vittorio Messori, 1985). Apesar das palavras lamuriosas, Ratzinger não cogitou em questionar o "legado do concílio", muito menos em fazer efetivamente algo para mudar a situação. Este tipo de autocrítica estéril, sem nenhuma conseqüência prática, já havia sido inaugurada por Paulo 6º. Num discurso em 29 de junho de 1972, ele disse: "Acreditávamos que após o concílio veríamos um dia de sol para a igreja. Mas, em vez do sol, vimos nuvens, tempestades, trevas... Por alguma fissura, a fumaça de satã entrou no templo de Deus". Durante todo o seu pontificado, João Paulo 2º continuou “sentindo a fumaça “, mas recusou-se a identificar a origem do fogo; não compreendeu que uma instituição espiritual não pode sobreviver com ideias vagas, frouxas, ambíguas e superficiais. De nada adiantarão os diversos e dispendiosos projetos em curso, especialmente os de marketing e comunicação; a história mostra que só uma ideia clara e poderosa, e respeito pelos ritos cuja origem é supra-humana, podem sensibilizar e mover almas. Desde então, houve muita agitação, na área litúrgica e doutrinal, falou-se muito, escreveu-se muito, houve muitos eventos de massa, mas não se pode, em definitivo, dizer que seus responsáveis deixaram um legado sólido para as futuras gerações. A mentalidade do aggiornamento, à qual os anos de João Paulo 2º e, depois, de Bento 16 e de Francisco, deram solução de continuidade, tem se caracterizado, ao contrário, pela superficialidade intelectual e a indigência espiritual. Apesar de ter sido o braço direito de Wojtyla por um quarto de século, alguns ainda sustentam que as ideias do atual “papa emérito” não são suficientemente conhecidas. Seu ideário, contudo, pode ser bem compreendido se prestarmos atenção às suas próprias palavras. Nos anos 1950, sua tese de habilitação ao seminário de Freising, na Alemanha, foi recusada por "falta de rigor teológico", suspeita de "heterodoxia neo-modernista" e por "subjetivizar o conceito de Revelação". Na autobiografia La Mia Vita, Ratzinger criticou a principal escola teológica católica, a tomista, como "fechada em si mesma, impessoal e préfabricada". 9

No livro Princípios de Teologia Católica, Ratzinger elogiou "o impulso dado por Teilhard de Chardin", cuja "ousada visão incorporou o movimento histórico do Cristianismo ao processo cósmico da evolução". Vê-se, assim, que a influência do jesuíta francês continua forte. Bento 16 citou-o novamente na sua primeira homilia de Páscoa como papa, em abril de 2006: “A ressurreição de Cristo é algo diferente: se tomarmos emprestada a linguagem da teoria da evolução, trata-se da maior das mutações, o salto mais crucial rumo a uma dimensão totalmente nova...”

O espírito da fala, desnecessário realçar, é completamente

teilhardiano. Na mesma obra, Ratzinger escreveu que "a Verdade se torna função do tempo... Fidelidade à verdade de ontem consiste em abandoná-la e assumi-la na verdade de hoje." Na missa Pro eligendo pontífice, contudo, rezada por ele um dia antes de ser elei...


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