Cap. 1 O mito da neutralidade científica - Japiassu, Hilton PDF

Title Cap. 1 O mito da neutralidade científica - Japiassu, Hilton
Course METODOLOGIA DA PESQUISA EM DIREITO
Institution Universidade Federal da Bahia
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Fichamento/Resumo do capítulo 1 do Mito da Neutralidade Científica de Hilton Japiassu...


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Bibliografia: JAPIASSU, Hilton. O mito da neutralidade científica, cap. 1. Informações sobre o autor: Hilton Japiassu faleceu em 2015 aos 81 anos. Formado em Filosofia pela PUC-Rio (1969); Doutor em Filosofia pela Universidade de Grenoble, França; Professor da PUC-Rio e da UFRJ; Foi responsável pelas disciplinas de epistemologia e história das ciências nos cursos de graduação e pós-graduação em Filosofia da UFRJ; Escreveu inúmeras obras no campo da epistemologia e da história das ciências, dentre as quais se destacam: Nascimento e morte das ciências humanas; O mito da neutralidade científica; Questões epistemológicas; A pedagogia da incerteza; Psicanálise: ciência ou contraciência?; Ciência e destino humano; O eclipse das ciências humanas, e Desistir do pensar? Nem pensar. Resumo: Hiton Japiassu começa o texto questionando-se acerca dos problemas epistemológicos referentes a objetividade científica. Este pressuposto se mostra extremamente contraditório, tendo em vista que por trás dessa objetividade cientifica está a intenção subjetiva do cientista e, além disso, a existência das intenções daqueles que estão no controle da dita “politica” científica ou que orientam a pesquisa, estabelecendo, desse modo, os critérios de sua validação. A atitude epistemológica mostra-se extremamente necessária na tentativa de se combater uma atividade mecânica e acrítica. Percebe-se atualmente que há um esforço no sentido de relativizar a ciência, pois as evidências históricas e a existência de diversas “escolas” com teorias por vezes antagônicas, comprovam ser quase impossível defender a existência de uma “verdade” científica. Nesse contexto, Japiassu defende a ideia de conhecimento-processo, pois a atividade científica encontra-se em estado de constante inacabamento, sendo influenciada pelo contexto histórico social. Demais disso, Japiassu sustenta que os juízos de valor são elementos constitutivos do acesso ao saber objetivo, problematizando, desse modo, a questão da neutralidade científica. Citações e comentários: “(...) não podemos fazer um estudo crítico dos princípios das diversas ciências, de seu valor e de seu alcance, sem nos interrogarmos ao mesmo tempo sobre a natureza e o valor dos procedimentos pelos quais elas se constroem e chegam a um conhecimento objetivo. Ademais, a reflexão epistemológica surge sempre como uma imposição das “crises” desta ou daquela disciplina científica. E essas crises são ·o resultado de uma lacuna dos métodos anteriores, que deverão ser ultrapassados pela invenção de novos métodos.” (p. 21) “A epistemologia atual reconhece que “a” ciência não existe mais. O que existe sãos "as" ciências. Talvez fosse mais adequado falar de práticas cientificas. Porque falar de "a" ciência, é adotar, no ponto de partida, uma tese idealista e abstrata. E quando falamos de "significação" da ciência, queremos falar da ciência enquanto prática humana. Nesse sentido, a objetividade da ciência significa, antes de tudo, a intenção subjetiva do cientista, que se caracteriza pela busca do conhecimento. Em segundo lugar, significa as intenções implícitas ou explícitas daqueles que elaboram a "política" científica ou que, direta ou indiretamente, orientam a pesquisa, procurando estabelecer os critérios de sua validação.” (p. 22)

“O que a reflexão epistemológica atual mostra é que aquilo que comumente chamamos de "metodologia das ciências'', não passa de uma disciplina meramente instrumental” (p. 22) [A metodologia não pode ser vista como um fim em si mesma, mas, sim, como um meio para atingir determinado fim.] “Nesse domínio, é bastante comum a confusão entre "metodologia" e "técnicas" de pesquisa.” (p. 22) [A metodologia apresenta uma preocupação propriamente teórica (ideia de que devemos ir do racional ao real), ao passo que as técnicas se relacionam mais a empiria. A empiria não assegura caráter científico a pesquisa, entretanto, é preciso frisar que a preocupação teórica não tem por finalidade desprezar a preocupação empírica.] “(...) a diferenciação teoria-empiria não passa de resquício saudosista de um dualismo já ultrapassado.” (p. 23) “Em primeiro lugar, a atitude epistemológica, eminentemente crítica, obriga todos aqueles que elaboram métodos educacionais a se questionarem sobre a cientificidade ou objetividade de sua própria disciplina. Ademais, leva-os a se interrogarem criticamente sobre o valor científico de seus produtos intelectuais. (...) a atividade científica deve estar isenta e liberta de todas as aderências subjetivas e "opinativas".” (p. 24) “Sem o suporte de uma epistemologia, o metodólogo cai fatalmente num tipo de atividade mecânica e pouco inteligente, porque acrítica. (...) Atualmente, tomou-se praticamente impossível sustentar a existência de uma "verdade" científica. Um pouco de epistemologia histórica revela que aquilo que já foi considerado sumamente científico, foi posteriormente ridicularizado.” (p. 24) “Ela [a atividade científica] é uma atividade humana e social como qualquer outra. Está impregnada de ideologias, de juízos de valor, de argumentos de autoridade, de dogmatismos ingênuos (...).” (p. 24) “Não podemos ser ingênuos a ponto· de ignorarmos que todo sistema educacional carrega as marcas da sociedade que o instaura. (...) As "ciências" da educação, à medida que tentam eliminar as ideologias, para se tornarem científicas, são produtoras de ideologias e de sistemas valorativos.” (p. 25) “É a essa realidade que chamamos de processualidade epistemológica das ciências. Nesse sentido, toda ciência é processual. Devemos passar da ideia de um conhecimento-estado à ideia de um conhecimento-processo. (...) Em outros termos, a função da epistemologia consiste, entre outras atribuições, em mostrar que à atividade científica é um produto humano e, por isso, uma realidade sócio histórica. Por definição, a atividade científica encontra-se em estado de constante inacabamento. Ela está sempre fazendo-se e construindo-se.” (p. 26) [Em relação a processualidade da ciência, Japiassu defende 5 elementos epistemológicos: 1. A verdade cientifica é um conceito histórico; 2. Não a ciência absolutamente isenta de valorações e ideologias (é um produto humano); 3. A cientificidade de algo não é determinado por critérios prévios e invariáveis, mas, sim, por controles intersubjetivos; 4. O que mais entrava o progresso científico são as posições dogmáticas – o erro é um elemento essencial a teoria; 5. Na realidade, tudo é objeto de discussão] “E compete à epistemologia revelar como a ciência constrói seus objetos. É de sua alçada mostrar por que os cientistas dão preferência a este ou àquele tema em detrimento de outros, bem como mostrar quais as categorias de análise (instrumental conceitual de uma teoria) que são empregadas.” (p. 28)

“No processo de objetivação, a presença dos juízos de valor não é uma simples anomalia epistemológica, mas um dos elementos constitutivos do acesso ao saber objetivo. Este continua sendo o ideal das ciências humanas. Epistemologicamente falando, toda ciência constrói seu objeto, elabora seus dados e seus fatos. O fato puro não existe. Todo fato é construído. E a objetividade sempre se perde em pressupostos que estão longe de ser objetivos.” (p. 29) “Assim, o problema epistemológico central consistia em determinar os limites e o alcance dos conhecimentos fornecidos pelas ciências humanas. Esse problema revelava uma crise nas ciências humanas, dando inclusive lugar a uma intemperança crítica e dogmática que afastou os cientistas de seu verdadeiro objetivo epistemológico.” (p. 30) “Para Weber, nenhum valor, nem mesmo o da ciência, pode ser compreendido empiricamente. O objetivo da ciência é a procura indefinida e o progresso do conhecimento por si mesmo. Seus resultados só são verdadeiros em virtude das normas lógicas de nosso pensamento.” (p. 31) “(...) nessas condições, a significação da ciência, para a cultura, bem como a significação da cultura, considerada como um crescimento de valor, não se deixam fundar cientificamente. Pelo contrário, são sempre pontos de vista axiológicos e, por conseguinte, discutíveis.” (p. 32) “(...) de um lado, situam-se os defensores da neutralidade científica; do outro, os partidários de um engajamento por parte dos cientistas. Os “neutros" acham que os "engajados" acabam por envolverse no sistema social vigente e por justifica-lo. Os "engajados" acusam os "neutros'' de absenteísmo: quem cala, consente; e o silêncio contra o regime é uma forma de justificá-lo.” (p. 32) [A independência face aos valores] “Segundo Weber, a independência face aos valores está vinculada ao seguinte fato: a ciência, em geral, e as ciências sociais, em particular, devem limitar-se a um papel puramente explicativo. Nesse sentido, não devem determinar as modalidades do comportamento humano, nem tampouco devem definir normas políticas, econômicas, morais ou outras. A exclusão dos juízos de valor constitui a condição externa da objetividade das ciências sociais. A condição interna está na possibilidade da explicação causal.” (p. 33) “Contudo, o fato de as ciências sociais excluírem os valores não-significa que não se relacionem com eles. Pelo contrário, não somente podem tomar os valores como objeto de suas investigações, mas também uma de suas tarefas principais consiste em determinar as condições de sua realização.” (p. 33) “Ademais, é preciso que seja levado em conta o conhecimento da significação daquilo que se quer: os fins são conhecidos e escolhidos de acordo com o contexto e a significação que se pretende. Em outros termos, os fins são escolhidos quando se pode indicar e desenvolver, de modo logicamente correto. quais são as "ideias" que estão, ou poderiam estar, subjacentes ao fim concreto. Porque "uma das tarefas mais importantes de toda ciência da vida cultural humana consiste em abrir a compreensão intelectual às "ideias" pelas quais os homens lutaram ou continuam lutando". E Weber mostra que isso não ultrapassa os limites da ciência. Esta deve buscar "a ordem pensante da realidade empírica" e os meios que servem para a explicitação desses valores mentais.” (p. 35) “Weber crê na possibilidade de estudar os próprios juízos de valor como objeto científico. O sujeito pode estudar cientificamente os valores sem se comprometer com eles, quer dizer, permanecendo isento de suas contaminações.” (p. 35) “Contado, é bastante clara a posição de Weber em favor da isenção dos valores nas ciências: só é científica a disciplina que proscreve a interferência dos juízos de valor. Mas Weber procura a todo

custo, como um dever sagrado, evitar que o juízo de valor seja tomado como se fosse um argumento científico. Chega mesmo a falar de um dever cientifico de procurar e atingir a verdade dos fatos. Essa verdade deve ser a mesma para todo mundo, independentemente do tempo e do espaço.” (p. 36) “Segundo Marcuse, Weber teria colocado a ciência à disposição da economia política e, consequentemente, inteiramente a serviço do sistema, uma vez que renunciou a discutir o próprio sistema, em cujo contexto aparece a questão de seus fins e de seus valores.” (p. 37) “Na origem dessas disciplinas [ciências sociais] estão sempre presentes pressupostos axiológicos, condicionados historicamente pelo contexto cultural em que surge a investigação científica. Tais pressupostos são "subjetivos”, pois constituem um ponto de partida extra científico, não derivando da investigação objetiva.” (p. 38) [A presença dos pressupostos axiológicos – pressuposições valoradas - não impende que as ciências sociais tenham o seu papel científico.] “Em toda investigação científica, são inevitáveis os pressupostos axiológicos. Contudo, o importante é que seu emprego deve estar submetido a certas regras. Pietro Rossi enumera três regras que seriam válidas para o conjunto das ciências sociais: 1. Os pressupostos axiológicos devem ser enunciados formalmente, a fim de que fique bem claro que se trata de apreciações; 2. Devem ser utilizados como hipóteses de trabalho e postos à prova no decorrer da investigação; 3. Devem converter-se em "modelos explicativos" que serão conservados ou afastados segundo a experiência.” (p. 38) “Evidentemente, embora sejam todas indispensáveis, essas regras não têm o mesmo valor, nem tampouco a mesma função. A primeira é puramente formal; é insuficiente, pois o fato de se admitir um pressuposto axiológico não garante que seja bem fundado, embora impeça que seja confundido com os fatos. A segunda se refere ao método e estabelece o caráter hipotético dos pressupostos axiológicos: hipóteses que poderão ser refutadas ou confirmadas pela investigação científica. A terceira determina a relação entre os pressupostos axiológicos e o processo explicativo, reconhecendo que a referência à experiência se toma decisiva para a adoção ou a rejeição de uma hipótese explicativa. Consideradas em conjunto, as três regras conseguem dar nova forma à noção de "independência face aos valores" e estabelecem o "modo de emprego" dos pressupostos axiológicos.” (p. 38) [Nesse contexto, Ralf Dahrendorf mostrou 6 postos de contato do cientista social com os juízos de valor: 1. No que se refere a escolha do tema; 2. Na seletividade da abordagem; 3. No que diz respeito a relação entre o objeto da sociologia e os valores – todo comportamento humano está regulado por normas sociais; 4. No que tange o esforço que tende a apresentar os postulados práticos ou políticos como hipóteses científicas - tentativa de fazer passar por colocações científicas posições valorativas pessoais; 5. No que se refere a saber se o cientista é capaz de passar da teoria à prática - o que se pode afirmar é que, em certas condições, certas consequências são previstas; em outras condições, outras consequências, não se pode considerar determinada solução prática como absoluta; 6. O último ponto se refere à função social do sociólogo: “trata-se de saber se é da sua alçada tomar decisões práticas.”.] [Dicotomias Fato/Valor e Meio/Fim] “Do ponto de vista epistemológico, há uma dicotomia entre fato e valor, quer dizer, não há uma ponte de dedutibilidade entre ambos: de um fato não se segue um valor; tampouco de um valor se segue um fato. Do valor, por exemplo, segundo o qual a mulher deve trabalhar, não se deduz logicamente que ela trabalhe de fato. E mesmo que seja um fato que ela trabalha, não se pode deduzir que deva trabalhar” (p. 40)

“Segundo a terminologia weberiana, fato diz respeito àquilo que é, enquanto valor se refere àquilo que deve ser. Contudo, essa distinção não leva a uma demarcação radical entre algo puramente factual e algo puramente valorativo” (p. 41) “Enquanto fenômeno, o fato permanece exterior à pessoa. Enquanto acontecimento valorativo, está ligado a ela por um interesse. Nesse sentido, o fato não é neutro, pois, de algum modo, envolve a pessoa. (...) o sujeito seleciona o que lhe interessa na realidade. É por isso que todo fato é de algum modo valorado. Se não é valorado, é porque não é conhecido, isto é, não despertou interesse no sujeito. Este só vê na realidade os pontos que lhe interessam.” (p. 41) “Na realidade, o fato é resultado de uma valoração. Nesse sentido, o conceito de neutralidade é irreal: é um modo de conferir valor a uma atitude de preferência a outras.” (p. 41) “O mesmo ocorre com a disjunção meio/fim. O meio não se situa no domínio objetivo, mas é função de um fim preestabelecido. Pode o fim ser abstraído e desconsiderado? Quando se escolhe os meios para se atingir o fim, a propriedade do fim repercute na escolha: a aptidão do meio é julgada conforme o que se queira no fim.” (p. 41) “Assim, relativamente ao fim, a neutralidade não é uma isenção, mas um modo específico de tomar posição. A distinção entre meio e fim é artificial. (...) Por sua vez, a bomba atômica é factualmente um instrumento neutro de explosão. Todavia, no contexto de seus pressupostos, e que lhe conferem sentido, é um valor” (p. 42) “Quase todas as éticas adotam o princípio segundo o qual os fins não justificam os meios. Se estes fossem neutros, nem se colocaria o problema de sua justificação. Na medida em que são escolhidos em função de sua maior ou menor aptidão para se atingir o fim, é porque neles está presente o valor do fim.” (p. 42) [Não existe um meio neutro, pois ele está sempre voltado a alcançar determinado fim.] “A razão pela qual se escolhe este e não aquele meio, pelo menos em nossa sociedade atual, é a racionalidade da ação e do pensamento.” (p. 42) “No dizer de J. Habermas (La technique et la science comme "idéologie", 1968), Weber introduziu o conceito de “racionalidade" para caracterizar "a forma capitalista da atividade econômica, a forma burguesa das trocas no nível do direito privado e a forma burocrática da dominação. (...). Nesse sentido, o fim de uma empresa capitalista é a eficácia: maximização do lucro, acumulação de capital, consumo, investimento, etc. A racionalidade dos meios é proporcional ao fim visado. Num tipo de empresa que vê na produtividade o valor básico do sistema industrial, a tecnologia é um instrumento excelente, porque se presta melhor a tal objetivo. Ela não é puro meio, pois pressupõe a ideologia do fim. Em si mesma, é neutra. Acontece, porém, que a tecnologia, em si mesma, não existe, é pura abstração.” (p. 43) [A neutralidade não pode significar uma isenção de valor, mas, sim, uma ideologia, enquanto pensamento a serviço de um determinado interesse.]...


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