Os Maias- Episódio da Corrida de Cavalos e marcas da linguagem queirosiana PDF

Title Os Maias- Episódio da Corrida de Cavalos e marcas da linguagem queirosiana
Course Português
Institution Ensino Secundário (Portugal)
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Summary

Os Maias: O Episódio da Corrida de Cavalose marcas da linguagem queirosianaEsta obra trata-se da obra-prima de Eça de Queirós, publicada em 1888, e uma das mais importantes de toda a literatura portuguesa. Conta-nos a história da família Maia e encerra uma crónica de costumes, retratando, com rigor ...


Description

Os Maias: O Episódio da Corrida de Cavalos e marcas da linguagem queirosiana Esta obra trata-se da obra-prima de Eça de Queirós, publicada em 1888, e uma das mais importantes de toda a literatura portuguesa. Conta-nos a história da família Maia e encerra uma crónica de costumes, retratando, com rigor fotográfico, a sociedade lisboeta da segunda metade do século XIX. Lisboa é o espaço privilegiado do romance, onde decorre praticamente toda a vida de Carlos ao longo da acção. O carácter central de Lisboa deve-se ao facto de esta cidade concentrar, dirigir e simbolizar toda a vida do país. Lisboa é aqui mais do que um espaço físico, é um espaço social. É neste ambiente monótono, amolecido e de clima rico, que Eça vai fazer a crítica social, corporizada em certos tipos sociais, representantes de ideias, mentalidades, costumes, políticas, concepções do mundo, etc. O conceito de "crónica de costumes" pressupõe o sentido de relato ou comentário de hábitos e comportamentos de pessoas numa sociedade em certo contexto. Na crónica de costumes, deve haver, então, uma reflexão sobre hábitos, atitudes e comportamentos das pessoas no quotidiano da sociedade em que se encontram. Deve haver um olhar crítico relativamente a questões relevantes na conduta social. Na obra Os Maias, a crónica de costumes é mais importante do que a própria intriga romanesca. Para Eça de Queirós, a estrutura do romance obedece prioritariamente à vontade de fazer uma desenvolvida crónica da vida social lisboeta do seu tempo. O episódio da corrida de cavalos é uma crítica à tendência dos portugueses para imitar aquilo que se fazia nos países estrangeiros e que se considerava como um sinal de progresso. O autor critica e caricatura uma sociedade que aplaude a organização das corridas na sua ânsia de imitar o que de melhor há «lá fora», sobretudo em Paris, modelo de civilização. Porém, como em Portugal não havia a tradição nem o hábito de realização de tais eventos, em vez de um grande acontecimento mundano, assistimos a um grande fiasco, a mais uma manifestação do gosto pela aparência e pelo postiço, em detrimento daquilo que é autêntica e genuinamente português. O ambiente, que deveria ser requintado, mas, ao mesmo tempo, ligeiro, como compete a um evento desportivo, era deturpado pela falta de gosto e pelo ridículo da situação, que se queria requintada mas acabou por não o ser. É de destacar alguns aspetos, como o facto de o hipódromo parecer um tanque de arraial, o bufete ter um ar sujo, de a primeira corrida terminar numa cena de pancadaria e ainda de haver uma falta de coerência entre o traje e a ocasião, sendo, por exemplo, que as senhoras se apresentavam com os seus vestidos sérios de missa. Ora, quem se encontrava presente simplesmente não sabia como agir, já que não revelava qualquer tipo de interesse por corridas de cavalos, pelo que o evento foi apenas

uma tentativa falhada de fazer parecer a sociedade portuguesa evoluída ao nível das sociedades das grandes capitais europeias.

Os alvos visados por Eça de Queirós são, basicamente, dois: • a Monarquia, pela falta de autoridade que o Rei demonstra, pois a sua presença não consegue impedir as várias desordens; • a alta sociedade lisboeta, pela sua falta de civismo, pelo fracasso total dos objetivos da corrida, pela falta de educação e de cultura, pelo desinteresse e ainda pelo provincianismo Toda a situação é, resumidamente, uma contradição flagrante entre o ser e o parecer. Tanto o espaço físico como o espaço social eram postiços. “Um sopro grosseiro de desordem reles passava sobre o hipódromo, desmanchando a linha postiça de civilização e a atitude forçada de decoro…” ; é assim que o autor descreve, na obra, a corrida de cavalos. Devemos, então, ressaltar deste episódio o fracasso das corridas, o atraso da sociedade lisboeta e a sua falta de civismo. Podemos observar que algumas das críticas realizadas neste episódio ainda podem ser aplicadas à sociedade portuguesa, nomeadamente ao facto de muitos ainda se prenderem à ideia de que o que é estrangeiro é melhor do que o que é nacional. Ainda assim, creio que estamos a fazer progressos quanto a essa questão, criando projetos e tentando levar as pessoas a valorizar os produtos e os talentos nacionais.

Ora, Eça de Queirós, para além do seu apurado sentido crítico possuidor de uma visão profunda da sociedade que tão bem descreve, é também rico em variedade e expressividade linguística. Algumas das características da prosa queirosiana são o uso do gerúndio, da ironia, do diminutivo, da dupla adjetivação, do discurso indireto livre, muito presente ao longo da obra, dos estrangeirismos e de várias figuras de estilo. A riqueza da prosa queirosiana reside também na criação de novas palavras, ao que chamamos neologismo, como é o caso de “gouvarinhar”, ou “cervejando”. Eça recorre, ainda, a anglicismos, isto é, vocábulos de origem inglesa, e a galicismos, ou seja, vocábulos de origem francesa. Quanto aos diminutivos utilizados, Eça emprega-os, maioritariamente, para sugerir ironia e depreciação, como acontece quando faz a descrição de “Eusebiozinho”. Por último, relativamente às figuras de estilo, as que Eça mais utiliza são a hipalage, a ironia e a sinestesia.

No episódio da corrida de cavalos, as marcas da linguagem queirosiana estão bem presentes, sendo que podemos encontrar bastantes sinestesias, como em expressões como “No Largo dos Jerónimos, silencioso e a escaldar na luz”, para além de conseguirmos observar o uso de neologismos, como “vermelhejavam” e “negrejava” e ainda de empréstimos, como “gentleman”, na expressão “era um gentleman”. Podemos ainda encontrar marcas de discurso indireto livre, como na expressão “Nessa tarde lá tinham voltado as palavras que ela balbuciava, caída sobre o seu peito, com os olhos afogados numa ternura suplicante “se tu quiseres! Que felizes seriamos! Que vida adorável! Ambos sós!…” ”. Para além de tudo isto, o uso do diminutivo com sentido pejorativo também esta presente neste episódio, nomeadamente quando Eça faz a descrição das irmãs de Taveira, “magrinhas, loirinhas,ambas corretamente vestidas de xadrezinho”.

Em suma, o estudo deste episódio em concreto permite-nos compreender a crítica que Eça de Queirós tece à importância que a sociedade portuguesa do século XIX atribuía às aparências, para além de nos demonstrar a falta de valor que essa mesma sociedade atribuía ao que era nacional. Compreender esta crítica leva-nos a compreender também o quão ridículo o esforço...


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