\"Ideia de Europa de George Steiner- resumo para matrizes clássicas da cultura europeia\" PDF

Title \"Ideia de Europa de George Steiner- resumo para matrizes clássicas da cultura europeia\"
Course Matrizes Clássicas da Cultura Europeia
Institution Universidade de Coimbra
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Resumo breve sobre o livro "Ideia de Europa" do autor George Steiner...


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Inês Sofia Caeiro Pão Mole 2018286292 No livro “Ideia de Europa”, o autor George Steiner procura encontrar o mínimo denominador comum entre aquilo que é a diversidade da história, da cultura e da paisagem do velho continente, expressando-o através de cinco axiomas ou ideias basilares. Começa a sua obra escrevendo uma expressão pouco complexa: “A Europa é feita de cafés”, representando o predicado desta simples frase o primeiro axioma, que será seguido de outros quatro importantes princípios basilares daquilo que é a ideia de Europa. Para começar e tal como já foi antecipado pela introdução, o café é o primeiro dos axiomas referido por Steiner. O autor atribui-lhe tanta importância que, para além de o abordar em primeiro lugar, chega a referir que “Desenhe-se o mapa das cafeterias e obter-se-á um dos marcadores essenciais da “Ideia de Europa””. Na sua caracterização, quando fala de café (produto oriundo da Africa Oriental), menciona uma tradição de sociabilidade e espaço de sociabilidade que é anterior à realidade do próprio café em si: “O café é um local de entrevistas e conspirações.”; “É o clube dos espirituosos e a posterestante dos sem-abrigo. Na Milão de Stendhal, na Veneza de Casanova…, o café albergava o que existia de oposição política, de liberalismo clandestino”. Eram precisamente estas ideias que se desenvolviam entre as comunidades do continente europeu que apreciam o sair de casa para ir ao café, que apreciam o sol e que apreciam o convívio nas praças, nas ágoras ou nos fóruns. Salienta, finalmente, a exclusividade dos cafés europeus opondo-os aos pubs ingleses, por exemplo, que em nada se assemelham aos “cafés da Europa”: “estes estabelecimentos não são cafés. Não têm mesas de xadrez, não há jornais à disposição dos clientes.” O segundo axioma começa por ser descrito com a frase “A Europa foi e é percorrida a pé”, destacando assim como a paisagem do velho continente desenhada a uma escala humana foi importante para a sua travessia. Metamórfica e paisagisticamente, a Europa é um território densamente povoado (desde a Idade do Bronze), situado numa região temperada e sem grandes acidentes geográficos, possibilitando a mobilidade e a intercomunicabilidade que existe na cultura europeia:” Não há Saras, Badlands, tundras inultrapassáveis.”; A Europa não tem um Vale da Morte, uma Amazónia, um outback inacessível ao viajante”. Contudo, esta facilidade de mobilidade não tem só vantagens, existem e existiram muitas desvantagens ao longo da Históriadesde o mundo romano, as invasões barbaras, as invasões napoleónicas ou a supremacia de Hitler, que constataram que efetivamente, o espaço europeu é facilmente invadido. O autor refere ainda que, ao contrário de outras regiões do mundo, a paisagem europeia é profundamente humanizada e desprovida de fenómenos geográfico ou climáticos hostis: “Metaforicamente, mas também materialmente, essa paisagem foi moldada, humanizada, por pés e mãos.”. Adicionalmente, Steiner caracteriza o pensamento europeu como tendo um ritmo peripatético, ou seja, de como o Homem europeu pensa e fala a andar: “Os componentes integrais do pensamento e da sensibilidade europeus são, no sentido radical da palavra, pedestres”; “Grande parte da teorização mais incisiva é gerada pelo ato de caminhar”. De modo a dar consistência a este seu princípio, Steiner identifica várias evidências que aconteceram ao longo da história e dá o exemplo das “mediações de Rousseau”, das “extensas deambulações de Kierkegaard por Copenhaga” ou até dos Soldados de Alexandre que “marcharam desde a Grécia continental às fronteiras da India e ao deserto líbio”. Conclui este axioma destacando, mais uma vez, a exclusividade do pensamento peripatético do homem europeu, dando o exemplo de Holderlin- “ Holderlin vai a pé da Vestefália a Bordéus e volta”-, oposto ao americano, por exemplo: “ Numa era americana, que é a do automóvel e do avião a jato, mal conseguimos imaginar as distancias percorridas e colocadas ao serviço intelectual e poético pelos mestres europeus”. O terceiro axioma prende-se com a nomeação de ruas, praças e lugares nomeados segundo cientistas, artistas, escritores ou acontecimentos históricos (exemplo: Praça da República; Avenida dos Aliados; Rua 25 de Abril). Esta humanização dos espaços habitáveis europeus através de uma toponímia que reflete nomes da História faz com que haja uma permanência constante da memória no espaço do Velho Continente: “Cidades como Paris, Milão, Florença, Francoforte, Weimar, Viena, Praga ou S. Petersburgo são crónicas vivas. Ler as respetivas

Inês Sofia Caeiro Pão Mole 2018286292 toponímicas é folhear um passado presente”. O autor, para destacar esta originalidade toponímica do espaço europeu, dá o exemplo dos Estados Unidos da América, em que as ruas e as avenidas não têm nomes com um passado histórico, são “simplesmente numeradas”. Para concluir este axioma, o autor refere, apesar de tudo, aspetos negativos, relacionados precisamente com esta permanência de memória quase forçada nos dias de hoje. Isto porque, ao contrário do Japão e da China, por exemplo, que não fazem parte do novo mundo e recomeçaram do zero, sem carregar o peso do passado, o Homem europeu não se pode livrar da sua história. Nem o Homem europeu se pode livrar do seu passado, nem o continente europeu pode recomeçar, uma vez que o seu destino é a continuidade: “ Até uma criança na Europa se dobra sobre o peso do passado como tão frequentemente se dobra sob o peso das mochilas escolares demasiado cheias”. O quarto axioma está relacionado com uma dualidade primordial- a herança dupla de Atenas e Jerusalém-, uma “relação simultaneamente conflituosa e sincrética”. Segundo o autor, ser europeu implica uma negociação entre Atenas- símbolo da tradição clássica, da razão, da ciência e da arte, e Jerusalém- cidade sagrada de referência para as três grandes religiões monoteístas, símbolo da moralidade e da justiça: “ Ser europeu é tentar negociar, moralmente, intelectualmente e existencialmente, os ideais, afirmações, praxis rivais da cidade de Sócrates e da cidade de Isaías”. No tópico deste princípio basilar, Steiner afirma que existem três ocupações humanas: a música, que é universal, não exclusiva da Europa-, a matemática- que nasceu das civilizações do Egito e da Mesopotâmia-, e o pensamento especulativo- “no qual incluo a poesia, cuja melhor definição será música do pensamento”. Explica, na mesma sequência de raciocínio, que “ estas três atividades são exclusivas dos homens e das mulheres e aproximam se tanto quanto algo se pode aproximar da intuição metafórica de que fomos realmente criados à imagem de Deus”, de modo a concluir que “ estes três notáveis dignitários do intelecto humano e da formação da sensibilidade- musica, matemática e metafisica-, subscrevem a afirmação de Shelley de que “somos todos gregos”. Numa nota de rodapé, será importante referir que a época helenística, caracterizada pela difusão da civilização grega no mundo mediterrâneo, euro-asiático e oriental, funcionou como um momento fulcral para o desenvolvimento das ocupações anteriormente referidas. Depois desta abordagem a Atenas, não é exagerado afirmar que o destino da Europa não deriva menos do legado de Jerusalém: “Não existe praticamente nó na textura da existência ocidental que não tenha sido tocado pela herança do hebreu. Steiner destaca, neste âmbito, a religião, sobretudo: “o desafio monoteísta, a definição da nossa humanidade enquanto diálogo com o transcendente e o conceito de um livro supremo têm origem na singularidade enigmática e na dispersão de Israel”. De forma resumida, apesar de tanto a Grécia como Roma terem religiões politeístas que posteriormente se transformaram em religiões monoteístas, o mundo de Jerusalém, por um lado, traduziu-se num livro de referencia- a Bíblia-, e o judaísmo, por outro lado, traduziu se num livro sagrado distinto- a Tora-, que tem os cinco primeiros capítulos da Bíblia. Os deuses das duas religiões têm, na sua generalidade, características comuns: são antropomórficos, invisíveis ao homem, luminosos, maiores que o homem, superlativamente, e consequentemente mais poderosos. Desta forma, e depois de analisar a Herança das duas cidades para o espaço europeu, Steiner conclui que “A “Ideia de Europa” é, na verdade, um “conto de duas cidades”, em que nenhuma se sobrepõe a outra. O quinto e último axioma é referente a “uma consciência própria escatológica”, à apreensão de “um capítulo derradeiro, daquele famoso ocaso que assombra a ideia e Europa, mesmo nas suas horas mais luminosas”. Com este quinto axioma, George Steiner conclui o seu livro refletindo

que, por mais promissora que seja uma civilização, ela chegará ao fim: “Num formato secular, intelectualizado, encontra se explicitamente na teoria da historia de Hegel um “ sentido de um final”, tal como se encontrara na formulação pomposa de entropia, de Carnot, da extinção inevitável de toda a energia”. Este conceito de fim está também muito presente em diversos mitos, ideias e teorias que foram aparecendo ao longo da História. Um dos mitos mais conhecidos é o “Mito das Cinco Idades”, da autoria de Hesíodo e presente na sua obra de “Trabalhos e Dias”. Segundo Hesíodo, as idades do Homem são

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comparadas aos metais (ouro, prata, bronze, heróis e ferro), sofrendo uma degenerescência, desde a melhor- ouro-, até a pior-ferro. A primeira idade era a do Ouro, em que os humanos viviam entre os deuses e morriam de forma pacífica: “ De ouro era a primeira geração de homens mortais/ criada pelos imortais que habitam as moradas olímpicas./ Eram do tempo de Cronos, quando ele reinava no céu;/(…) Sem a presença da triste/ velhice(:::)/ Morriam como se vencidos pelo sono”. Na segunda idade- a da Prata-, os humanos viviam durante cem anos, antes de envelhecerem rapidamente e morrerem: “Os filhos, junto sem anos, junto da mãe prudente, / eram criados e brincavam (…) dentro de casa. / Mas quando cresciam e atingiam o limiar da juventude, / viviam durante muito pouco tempo, sujeitos a sofrimentos por irreflexão”. Esta geração pouco impiedosa era pouco apreciada por Zeus, sendo por ele extinguida por desrespeitarem os deuses: “Então Zeus/ (…) os fez desaparecer, porque não prestavam honras/ aos deuses bem-aventurados que detêm o Olimpo”. Na terceira idade- a do Bronze-, os humanos limitavam-se a guerrear utilizando as suas armas feitas em bronze e acabando por se matarem uns aos outros: “De bronze eram as suas armas, de bronze feitas as casas/ e com bronze trabalhavam”. A quarta idade e a anterior à nossa é a idade dos Heróis, em que existiam apenas semideuses:” Zeus Crónida criou, mais justa e melhor” / estirpe divina de homens heróis, que se chamam/ semideuses, anterior à nossa na terra sem limites”. A quinta e última idade é a nossa- a idade do Ferro-, em que a degradação da humanidade estagnou e em que Hesíodo defendia que pelos deuses seria extinguida, numa altura em que os bebes nascessem com cabelo grisalho:” Pois agora é a raça do ferro; não mais, quer de dia,/ quer de noite, cessaram as fadigas e as misérias/(….) Mas Zeus destruirá também esta raça de homens mortais, / Quando, ao nascerem, apresentam já brancas as têmporas.”. Esta visão da história da humanidade como uma sucessão de ciclos finitos e irrepetíveis acontece simultaneamente ao ciclo biológico humano- nascer, crescer, reproduzir-se e morrer. Posteriormente, também na tradição medieval encontramos traços de continuidade desta perspetiva de analisar a história, nomeadamente nas obras do cristão Santo Agostinho e na conceção do conceito de “Translatio Imperii”. Por um lado, na obra de Santo Agostinho, o homem atravessou seis eras, tal qual como os seis dias que Deus levou a criar o mundo: a primeira- de Adão até Noé-; a segunda- de Noé ate Abraão; a terceira- de Abraão até David-; a quarta- de David até ao cativeiro na Babilónia-; a quinta-, desde o cativeiro até à vinda de Cristo; a sexta- do tempo presente-, e a sétima- a do Apocalipse, que se realiza da segunda vinda de Cristo e que marcará o fim dos tempos. Desta forma, os tempos da humanidade durariam sete mil anos, com épocas críticas no passar de cada mil anos- milenarismo. Por outro lado, o conceito de “ Translatio Imperii” é referente a uma política desta época medieval segundo a qual os povos se organizam de acordo com lideranças cujo poder não é permanete. Este conceito assentava sobretudo no providencialismo, ou seja, nenhum poder se forma sem que Deus o tenha permitido. Desta forma, para concluir o quinto axioma proposto por Steiner, é importante referir que o fim do mundo clássico representou um acontecimento grave mas não fatal para a história da humanidade, tendo esta crença na transferência de impérios legitimado os poderes supranacionais nascidos segundo o modelo imperial de Roma, nomeadamente Bizâncio, o império carolíngio, o sacro-império romano-germânico e o império russo anterior a Pedro II. Em suma, o autor termina o seu livro acrescentando que atualmente, esta Europa que é nossa e que nos conhecemos, carregada de História e referências ao mundo clássico, pode estar à beira do colapso, se não fizermos nada para o evitar. É verdade que a padronização tecnológica da vida quotidiana e a universalidade da internet são legitimamente

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considerados grandes passos rumo a uma eliminação de fronteiras e ódios antigos. Contudo, a europa morrerá efetivamente, se não lutar pelas suas línguas, tradições locais e autonomias sociais. Apesar de a” nossa arquitetura, arte, música, literatura e pensamento filosófico encontram se saturados de referências e valores cristãos”, as vagas gigantescas de agnosticismo, ou mesmo ateísmo, estão a iniciar uma alteração profunda na evolução milenar da europa. É possível, apesar de tudo, que surja uma europa pós-cristã, embora lentamente e de formas difíceis de prever: “Se conseguir libertar-se da sua própria herança negra, confrontando-a sem receios, a Europa de Montaigne e Erasmo, de Voltaire e Immauel Knat pode, uma vez mais, indicar o caminho a seguir”....


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