resumos e análises de contos de 12º ano PDF

Title resumos e análises de contos de 12º ano
Author Beatriz Sousa
Course Português 11 ano
Institution Universidade de Lisboa
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Liliana Vieira CondeContosManuel da Fonseca «Sempre é uma companhia»Maria Judite de Carvalho «George»_______________________________________________Manuel da Fonseca «Sempre é umacompanhia»O real é o alimento para a escrita.Manuel da Fonseca nasceu em Santiago doCacém, a 15 de outubro de 1911 e morr...


Description

Sebenta Português 12º ano

Contos Manuel da Fonseca «Sempre é uma companhia» Maria Judite de Carvalho «George» _______________________________________________

Manuel da Fonseca «Sempre é uma companhia» O real é o alimento para a escrita. Manuel da Fonseca nasceu em Santiago do Cacém, a 15 de outubro de 1911 e morreu em Lisboa, a 11 de março de 1993. Escreveu em prosa e em poesia, foi contista, romancista, poeta e cronista. Nas suas obras, carregadas de intervenção social e política, relata como poucos a vida dura do Alentejo e dos alentejanos. Era presidente da Sociedade Portuguesa de Escritores quando esta atribuiu o Grande Prémio da Novelística a José Luandino Vieira pela sua obra Luanda, o que levou ao encerramento desta instituição. Manuel da Fonseca, um dos vultos do Neorrealismo literário Português, descreveu, como ninguém, a paisagem, sobretudo aquela do Alentejo, aquela que viria a ser símbolo revolucionário ao Estado Novo. Local de valores primordiais, é aí onde se senta a maior tristeza, o tédio e a desesperança. Para além da denúncia social evidente, vemos também a caracterização das personagens: as paixões, as desilusões, as memórias do passado perto ou distante. Estas situações são evidenciadas nas reuniões da população nas tabernas ou nas pracetas da aldeia, por exemplo.

Liliana Vieira Conde 1

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O neorrealismo permite, assim, dar relevo às camadas populares através de uma análise profunda das condições de vida e das contradições da organização social. Não interessa a esta corrente literária os motivos populares, mas a posição ideológica tomada perante a realidade.

Solidão e convivialidade. O título «Sempre é uma companhia» remete para a companhia que a rádio vinha trazer à população isolada, invadindo a taberna e as suas vidas, com as notícias da II Guerra Mundial. No conto de Manuel da Fonseca, as primeiras páginas anunciam o isolamento geográfico, a solidão e o silêncio, bem como referem a chegada do automóvel. Os habitantes de Alcaria viviam em condições indignas, de tao forma que perderam, praticamente, as suas características humanas. A chegada da rádio viria a permitir a ligação com o mundo, a tomada de contato com informação nova e que permitia aos habitantes ter novos assuntos de conversa. Até mesmo as mulheres, que não costumavam frequentar a taberna, passaram a fazê-lo. Se a vinda da rádio havia interferido com a vida do casal, a possibilidade de ficarem sem a rádio era dolorosa, pois os habitantes regressariam novamente ao seu isolamento. A mulher de Batola, apresenta-se, no final, com um ar ternurento, contrastando com a altitude altiva inicial, afirmando que a radiofonia «sempre é uma companhia neste deserto»

Caracterização das personagens •

António Barrasquinho, o Batola – preguiçoso, improdutivo, sonolento, bêbado, bate na mulher; tem nome e alcunha típica do Alentejo; a sua indumentária é própria do homem alentejano. A Liliana Vieira Conde 2

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morte do seu amigo Rata, acentua a sua solidão. É «atarracado, as pernas arqueadas», usa «chapeirão» e um «lenço vermelho atado ao pescoço». •

Mulher de Batola – expedita, trabalhadora, incansável, é ela quem abre a venda e atende os clientes, voltando depois para a lida da casa; ela é «alta, grave, um rosto ossudo», dotada de um sossego único, característica advinda da sua possibilidade de por e dispor do governo da casa e do negócio.



Rata – era mendigo e viajante, uma espécie de mensageiro. Quando Batola o escutava a tarde inteira, parecia que também ele havia viajado pelo mundo. Quando deixou de poder viajar, suicidou-se.



Caixeiro-viajante



vendedor

de

aparelhos

radiofónicos,

comerciante e amigo de vender. •

Os homens de Alcaria – figurinhas metaforicamente apresentadas com gado e que vivem em casas «tresmalhadas»: «o rebanho que se levanta com o dia, lavra, cava a terra, ceifa e recolhe vergado pelo cansaço e pela noite. Mais nada que o abandono e a solidão.» Têm falta de esperança numa vida velhor. Batola contrasta com estes, pois pode preguiçar, bebe o melhor vinho da venda, tem um fio de ouro no colete, mas é solidário com os aldeãos. Partilha com este, a condição animalesca dos conterrâneos: “rumina” a revolta; os suspiros saem-lhe “como um uivo de animal solitário”.

A intriga



Peripécia banal: um engano de percurso leva um vendedor a Alcaria.



Isolamento geográfico da aldeia e ausência de comunicação: abandono, solidão e desumanização da população. Chegada do novo aparelho: a radiotelefonia.



Ligação ao mundo: música e notícias. Liliana Vieira Conde 3

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Alteração de comportamentos: devolução da humanidade.

O espaço •

Aldeia de Alcaria: “quinze casinhas desgarradas e nuas”.



Estabelecimento do casal Barrasquinho: “a venda” é um local onde reina o desleixo.



“Fundos da casa”: espaço de habitação sombrio separado da venda.



Locais “longínquos” por onde viajava Rata: Ourique, Castro Marim, Beja.

O tempo •

Tempo histórico: anos 40 do século XX (referência à eletricidade e à telefonia).



Passagem do tempo condensada: “há trinta anos para cá”, “todas as manhãzinhas”.



Tempo sintetizado: da chegada do vendedor à partida do vendedor e prazo de entrega do aparelho – um mês.

O narrador •

O narrador de terceira pessoa narra os acontecimentos, comenta, conhece o passado e o mundo interior das personagens (presença: não

participante;

ponto

de

vista:

subjetivo;

focalização:

omnisciente) •

O narrador centra a atenção do leitor no abandono e solidão sentidos pelo protagonista.

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• O narrador conhece os pensamentos de Batola e desvenda como se vão formando: o desgosto leva-o a fechar-se num mundo de evocações

A atualidade •

Isolamento e falta de convivialidade.



Relações entre homem e mulher.



Vícios sociais: o alcoolismo, a violência doméstica.



As inovações tecnológicas e alterações de hábitos sociais.

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Plural 12 ano, Raiz, 2018.

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Maria Judite de Carvalho «George» Nasceu em Lisboa a 18 de setembro de 1921 e morreu na mesma cidade em 18 de janeiro de 1998.

A obra de Maria Judite de Carvalho é constituída basicamente por novelas, contos e crônicas, ocorrendo frequentemente uma interpenetração entre esses gêneros, sendo difícil, desta forma, sua delimitação. A escritora publicou uma infinidade de crónicas em jornais e revistas, tendo sido algumas delas reunidas e publicadas em livros, mas a grande maioria ainda não foi recolhida. A crónica foi, portanto, o género predileto de Maria Judite de Carvalho.

• As três idades da vida; o diálogo entre realidade, memória e imaginação; metamorfoses da figura feminina; a complexidade da natureza humana.

✓ O título George rapidamente adquire mais duas formas: Gi e Georgina, permitindo identificar a mesma personagem em três fases distintas da vida, isto é, a juventude, a maturidade e a idade adulta; esta é a idade ideal para olhar para trás com espírito crítico e também para a frente, com esperança ou desalento, mas com alguma lucidez; ✓ George é uma pintora de sucesso, com 45 anos, que mora em Amesterdão; ✓ Esta é uma súmula da visão feminina de Maria Judite de Carvalho; ✓ Com 20 anos, Gi surge envolta numas pinceladas; passado recuperado pela memória; através do diálogo imaginário (solilóquio), a mocidade dela é apresentada com a tacanhez provinciana, o ambiente sociocultural, a falta de sintonia com a Liliana Vieira Conde 6

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família, a vocação artística e a vontade de fugir às restrições impostas pelo lugar de nascimento; ✓ Numa viagem de comboio (metáfora da passagem e da mudança) George confronta-se com Georgina, uma mulher velha que vive muito confortavelmente; o dinheiro advém das vendas da pintura de George; afirma que o único crime é a velhice, pois embora não tenha marido nem filhos, ela tem-se a si própria, não tendo sido vencida pelos estereótipos antigos de família; ✓ Ser velho pode ser mau, mas ser jovem ou estar a meio caminho também pode não ser assim tão entusiasmante; ✓ A viagem e a errância são a metáfora da vida – um outro tema deste conto.

“George” e a questão da(s) identidade(s) 2 Ao iniciarmos a leitura do conto “George” percebemos, logo nas primeiras linhas, um elemento que causa estranhamento: a descrição dos vestidos daquelas que, a princípio, seriam duas personagens: “Trazem ambas vestidos claros, amplos, e a aragem empurra-os de leve, um deles para o lado direito de quem vai, o outro para o lado direito de quem vem, ambos na mesma direção, naturalmente.” (CARVALHO, 1995, p. 32). O trecho transcrito nos remete à imagem do espelho, já que os dois sujeitos que caminham têm seus vestidos empurrados em sentido contrário, mas “ambos na mesma direção, naturalmente”, como uma imagem refletida em espelho. A partir da leitura desse trecho e de tal reflexão, sugere-se a possibilidade de tratar-se de uma só pessoa e não duas como se havia imaginado antes. A questão, portanto, que nos parece ser a principal deste conto, (mas não a única) é a fragmentação da representação unitária da identidade, já que a personagem George dialoga com seu passado e com seu futuro personificados em Gi e Georgina, respetivamente. Diversos críticos, como o já citado Stuart Hall (2006, p. 12), apontaram para uma compreensão da identidade como algo complexo e fragmentado: “O sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e estável, está se tornando fragmentado; composto não de uma única, mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias ou não resolvidas.” Gi, essa suposta “outra” pessoa com quem George se encontra, revela-se como alguém mais jovem. A descrição de Gi apresenta-se extremamente difusa: faltam-lhe contornos precisos. Ora, se considerarmos Gi uma outra figuração de George, essa descrição imprecisa poderia ser explicada como o resgate pela memória, já que esta sempre recupera fatos de forma difusa. George estaria, então, travando um diálogo com o seu passado, através da mediação da memória, que o resgata sem precisão. Gi seria quem George foi um dia e quer esquecer. Para complexificar ainda mais esta questão, surge na narrativa Georgina. Agora, mais 2

Renato Quintella de Oliveira, «George», a errância em busca de liberdade in https://periodicos.fclar.unesp.br/itinerarios/article/download/9703/6390

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Sebenta Português 12º ano velha que George, em oposição à Gi, Georgina passa a aconselhar a artista plástica renomada. A narrativa dá diversos indícios de que se trata, de fato, de um desdobramento do próprio sujeito que finge ser outro, ao projetar-se, agora no futuro. À maneira de Fernando Pessoa, Maria Judite de Carvalho constrói um ser disperso, sem unidade aparente. George aparece multifacetada e, tentando compreender-se, trava um intenso diálogo (ou monólogo?) consigo própria. O narrador apresenta ao leitor o que se passa no espaço interior de George: o confronto incessante entre esses diferentes “eus”. Tentando compreender e esquecer o que foi, George dialoga com Gi, jovem de 18 anos e ainda ingênua e inexperiente em relação às decisões importantes da vida. Tentando visualizar seu futuro, George dialoga com Georgina, senhora de quase 70 anos, já vivida, experiente e fisicamente decrépita, que não é, contudo, quem George quer ser. Nesta busca incessante e permanente, a personagem George procura uma explicação que confira sentido à sua existência interior. Terá encontrado? Ou julga ter encontrado pelo fato de ser bem sucedida, artística e financeiramente?

A busca de George: a febre de além Por não aceitar os espaços designados para Gi, George resolveu partir. Em busca de uma identidade, o sujeito da narrativa torna-se transgressor, rompe com as antigas relações, transforma sua aparência e habita novos espaços. Ao abandonar a sua raiz – a casa na vila – George cria asas e, ao não desejar criar vínculos, aluga casas com mobília (novo espaço privado) e adota o estilo de vida da cidade grande (novo espaço público). Na cidade, a personagem se desenvolve cultural e economicamente. Torna-se uma profissional das artes: a pintura, que seria um hobby para Gi, transforma-se em profissão para George. Ela ganha o mundo, ao viajar para vários países. A relação de submissão, na casa dos pais e na vila, é substituída por uma relação de poder absoluto sobre si. Nesse novo espaço público e privado, a estabilidade do sujeito não depende do casamento ou dos filhos que a completarão como mulher. A possibilidade de completude se baseia nas várias experiências amorosas e realizações profissionais. O respeito adquirido não se associa ao seu caráter como exímia dona de casa, mas como alguém que multiplicou seu capital através do próprio trabalho. No encontro com Georgina, a narrativa propõe uma reflexão a respeito da efemeridade do poder em uma sociedade excludente. De acordo com a futura versão de George, a casa mobiliada e a cidade grande não lhe farão sentido em sua velhice. Sua capacidade de produção não será mais a mesma e ela será excluída do jogo de interesses. Através da fala de Georgina, a narrativa nos deixa a seguinte questão: nessa constante troca de espaços, de valores e de ausência de determinados conhecimentos, chegará George a algum lugar?: “E, se for um pouco sensata, ou se souber olhar em volta, descobrirá que este mundo já não lhe pertence, é dos outros, dos que julgam que Baden Powell é um tipo que toca guitarra e que Levi Strauss é uma marca de calças.” (CARVALHO, 1995, p. 32). A vontade da personagem é o motor que impulsiona todas as suas conquistas, principalmente, a ânsia de liberdade. Por isso, George, ao optar pela não criação de laços afetivos permanentes, não quer se prender a móveis e família. Dessa forma, estará sempre pronta a partir. Há, Liliana Vieira Conde 8

Sebenta Português 12º ano inclusive, uma incerteza quanto à sexualidade da personagem, que assumiu um pseudônimo ambíguo (masculino/feminino), tanto que não se sabe se “o último dos seus amores” é um homem ou uma mulher: “[...] Vai morar com o último dos seus amores.” (CARVALHO, 1995, p. 44). Além disso, o nome George não é um nome próprio típico de Portugal. Uma família portuguesa tradicional não nomearia um de seus membros por George, o que reafirma a negação de uma identidade originária e o desejo de ser outro. Observa-se, assim, uma diluição de fronteiras antes demarcadas, no que diz respeito às questões de gênero, à temporalidade (passado, presente, futuro) e aos níveis do real e do imaginário, presentes no espaço textual.

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