Resenha do livro \"Não-lugares. Introdução a uma antropologia da supermodernidade\" Marc Augé. PDF

Title Resenha do livro \"Não-lugares. Introdução a uma antropologia da supermodernidade\" Marc Augé.
Course Topico Sociologia
Institution Universidade Federal do Piauí
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Resenha do Livro do Marc Augé "Não-lugares. Introdução a uma antropologia da supermodernidade"...


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1

AUGÉ, M. Não-lugares. Introdução a uma antropologia da supermodernidade.

Campinas: Papirus, 2004

“Marc Augé é antropólogo. Africanista, realizou pesquisas, sobretudo, na Costa do Marfim e no Togo. Foi presidente da EHESS, no período de 1985 a 1995, onde, atualmente, coordena o Centro de Antropologia dos Mundos Contemporâneos. A partir dos anos 1980, diversificou seus estudos, realizando pesquisas na América Latina e voltando seu interesse para as realidades do mundo contemporâneo, com seus contextos múltiplos e imediatos. Desta preocupação recente, há uma bibliografia que se tornou referência nas ciências sociais - são mais de trinta livros publicados, versando sobre diversos temas tais como: o turismo, os desafios da antropologia, entre outros. ” (Peixoto; Golobovante, 2007)

Em seu livro “Não-lugares: Introdução a uma antropologia da supermodernidade”, Augé se refere aos lugares transitórios, denominando-os de não-lugares. São os espaços onde não há tanta presença da pessoalidade, mas sim de uma identidade impessoal, que pode ser afirmada através de “símbolos da modernidade” – cartão de crédito, vale-transporte, carteira estudantil – que permitem a entrada nesses locais de passagem. Fora o prólogo e epílogo, nos quais o autor faz uma pequena descrição sobre um determinado momento de passagem nesses não-lugares, o livro é dividido em três partes: a primeira sendo intitulada de “O próximo e o distante”; a segunda como “O lugar antropológico”; e a terceira “Dos lugares aos nãolugares”. Em “O próximo e o distante”, Augé inicia o capítulo falando que há um debate com relação ao interesse dos etnólogos distantes e os próximos¹. Mas que para se ter mais clareza sobre esse debate é preciso primeiro de um embasamento sobre a antropologia do próximo. Para tanto, vale lembrar que a antropologia faz parte do aqui e do agora, de forma que o etnólogo sempre descreve aquilo naquele momento, fazendo assim que se tenha um 1 Visto que esse debate surgiu de um colóquio, sobre Antropologia social e etnologia da França, realizado em 1987 no Museu das Artes e Tradições Populares. Portanto, por próximo se entende o interesse no campo de pesquisa europeu.

testemunho de uma atualidade presente. E o aqui refere-se a esse campo de pesquisa europeu, que ganha esse nome quando comparado com lugares distantes. Essa distinção entre próximo e distante, no entanto, pode dar ideia de que há duas antropologias distintas. O que na prática é contestável, visto que, como põe Augé, a etnologia na Europa pode possuir o mesmo grau sofisticação e complexidade de lugares distantes – fazendo assim com que se pense no rigor do pesquisador. E também levar em conta que independente se a pesquisa é feita na África ou na Europa, as duas estão passiveis de possuírem um

olhar

antropológico

pois de

alguma

forma

possuem

características globais, fazendo assim com que se pense não na Europa, mas na contemporaneidade. Com isso o autor lembra que o etnólogo de campo tem a atividade de agrimensor, de configurar um universo significativo para que se possa passar representatividade. E há uma preocupação no modo em como essa representatividade é passada, ou seja, em avalia-la. Isso se dá tanto através de uma observação minuciosa, como pela capacidade de generalização do etnólogo. Por isso é muito importante a distinção do método e do objeto, porque objeto da antropologia não é a descrição exaustiva, mas sim se há um mínimo que se possa generalizar. E é importante dar uma definição do que se entende por pesquisa antropológica. Nisso Augé estabelece duas ocorrências: a primeira é que a pesquisa antropológica convém o estudo do outro (“exótico”, étnico, cultural) no presente. Ou seja, uma representação do indivíduo/do vínculo social que lhe é consubstancial. Para isso, no entanto, é preciso que haja um entendimento da concepção de cultura e de individualidade enquanto totalidades inacabadas, para que se possa ponderar o fato de que estas só exprimirem sua totalidade em certo ângulo. Até porque a pesquisa antropológica interpreta a interpretação que os outros se fazem da categoria do outro, em seus diferentes níveis e posições de necessidades A segunda está voltada para o mundo contemporâneo, que com suas transformações, suplica por um olhar antropológico. Para isso o autor põe três

transformações como exemplificação: a primeira transformação é sobre o tempo e como o utilizamos. – Poder pensa-lo através de uma nuance identitária, que pode ser abordado desde um as guerras mundiais, que não promovem progresso moral da humanidade, até no aceleramento da história (multiplicação de acontecimentos não previsto, fazendo com que haja uma superabundância factual), um problema que é de natureza antropológica. Como segunda transformação, se tem o espaço, ou o seu excesso. Esse excesso de espaço é chamado de superabundância espacial e está expresso nas mudanças de escola, na multiplicação das referências energéticas e imaginárias, e na aceleração dos meios de transporte. – Diferindo do espaço pré-contemporâneo idealizado pelos etnólogos. É a superabundância espacial que multiplica os não-lugares, e além disso, liquidifica os espaços tornando os cada vez mais individuais. Por fim, no mundo contemporâneo, a individualização das referências é a terceira transformação da supermodernidade que urge por um olhar antropológico.

Isso

porque

esta

transformação

assim

como

na

superabundância espacial, tem a característica de liquidificar. Neste contexto de singularidades, a liquidez aqui se refere, paradoxalmente, aos processos de relacionamento, que se tornando cada vez mais individuais se deslocalizam e aceleram muito rapidamente. Dito isso, vale mencionar que a antropologia contemporânea precisa se deslocar do método para o objeto, em vista de estar mais atenta as mudanças sociais que, através das três transformações já mencionadas, nesse contexto, chamam o olhar antropológico. Nesse contexto, é válido falar sobre o lugar que, comum ao etnólogo e ao indígena, é um lugar antropológico. Isso porque é nesse lugar onde o etnólogo se gaba de poder decifrar, através da organização do local, uma aparência de segunda natureza. De maneira que o etnólogo se sente como o “mais sabido dos indígenas e partilha a invenção de um lugar comum com estes. Esse lugar é identitário, pois é descoberto pelo seu reconhecimento pelos indígenas, e é através do etnólogo, com sua curiosidade e intervenção, que possui uma marcação identitária. Essa intervenção, como põe Augé, pode

gerar fantasias e ilusões: de um lado, os indígenas passam a ideia de terra intocada, de forma que o que há é um mundo fechado, sem nada para conhecer e os acontecimentos já são previstos, precisando assim apenas que sejam reconhecidos. De outro se tem o etnólogo com sua fantasia de terra transparente e que gera uma semifantasia, a de que o território se manteve contra ameaças e as terras foram valorizadas através da eficiência da previsão. A partir disso se tem a “tentação da totalidade” que seria a tentativa de percepção de uma sociedade transparente. São essas fantasias e ilusões que as vezes desconsideram o lugar comum como um lugar antropológico. – Por lugar antropológico se tem a construção concreta e simbólica que ultrapassa as pré-noções, de forma que o lugar possui uma “escala variável” através do investimento de sentidos. Vale lembrar que Marc Augé caracteriza o lugar antropológico como: identitário – constitui uma identidade, coletiva ou individual – relacional – identidade partilhada através de elementos que conferem o lugar comum – e histórico – possui estabilidade vive na história –. Além

dessas

características,

o

lugar

antropológico

também

é

geométrico, de forma que os espaços se combinam numa complexidade institucional e se relaciona com a sua construção material. Como é o caso do corpo, que é concebido como porção de espaço, tanto no seu caráter material como no psíquico. Para além disso, o corpo também se torna um conjunto de lugares de culto, fazendo assim com que se cruzem formas espaciais coletivas e individuais. As três características do lugar antropológico fazem parte da essência da modernidade, e a falta dessas características além de caracterizar, o que o autor chama de supermodernidade, também caracteriza o não-lugar. O nãolugar é um espaço não antropológico, onde não se integra lugares de memória. No entanto, vale lembrar que esses não-lugares nunca existem em sua forma pura, fazendo assim com que o lugar nunca seja completamente apagado e o não-lugar nunca se complete totalmente. Paira então esse embate entre o lugar e não-lugar, produzindo uma oposição do lugar ao espaço. Para isso é válido mostrar o que Michel de

Certeau expõe sobre lugar e espaço. – o autor caracteriza o lugar como sendo um conjunto de paralelos numa mesma ordem, e o espaço como sendo um “lugar participado”, a animação do lugar. Para Augé, no entanto, o lugar não é em absoluto a definição de Certeau, mas sim o lugar antropológico que, naturalmente, trespassa a caracterização de Certeau. No entanto, o que se quer com a definição do autor é tentar refutar uma definição negativa de nãolugar, criada quando se tenta opor espaço simbólico do lugar, ao espaço nãosimbólico do não-lugar. Com isso, vale mencionar que o termo espaço é algo abstrato, que se aplica a uma extensão e que é preciso de um uso sistemático do mesmo, pois como põe Certeau, o espaço é a “repetição da experiência da infância”. O espaço é a prática de lugares e não-lugares, vindos de um duplo sentido através do “viajante e das paisagens”. De maneira que o espaço pode ser dado com a prática os lugares, mas que, no entanto, há espaços onde o indivíduo é apenas espectador. Fazendo assim com que o espaço do viajante seja um arquétipo do não-lugar. Isso porque é nesse espaço que se pode encontrar a ausência de identidade, relação e história, pois esse é apenas um lugar de passagem, onde “o movimento não tem fim senão ele mesmo”. Como põe Baudelaire, é uma forma particular e moderna de solidão. Por isso é um arquétipo de não-lugar, pois envolve algumas características – deslocamento de olhar, jogos de imagem – da supermodernidade, que impõe consciências individuais e experiencias de solidão, que criam e disseminam os não-lugares. Vale lembrar que esses não-lugares possuem duas realidades complementares: a constituição do espaço com relação a fins; e a com relação dos indivíduos com o próprio espaço. E essas realidades provocam a tensão solitária, que é mediada por palavras e textos. Notadas, por exemplo, em percursos rodoviários que “evitam os lugares memoráveis, dos quais nos aproxima, mas os comenta”. Um ponto a ser ressaltado é que no não-lugar sempre há um contrato que sempre tem relação com a identidade individual daquele que está ali e que traz um anonimato que sempre precisa ser renovado através de um documento de identificação.

A entrada nesses não-lugares tem o poder de libertar, como põe Augé, o indivíduo de suas determinações habituais, através da solidão e solitude. Porque se vive na urgência do presente, onde não há espaço para a história. No entanto, apesar disso, o não-lugar possui o paradoxo de este servir como lugar de reconhecimento, por exemplo, para um estrangeiro que se encontra no anonimato através dos textos propagados. O que mostra que os lugares e não-lugares se interpenetram, usando Descombes “sempre se está e nunca se está em casa”. Em suma, é aí, nesse emaranhado de lugares e não-lugares que se encontra a supermodernidade posta por Augé....


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