Síntese do filme -Enigma Kaspar Hauser PDF

Title Síntese do filme -Enigma Kaspar Hauser
Course Identidade e Cultura
Institution Universidade Federal do ABC
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Síntese do filme - Enigma de Kaspar Hauser...


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Resenha Do filme ‘’ O enigma de Kaspar Hauser’’

O filme ‘’O enigma de Kaspar Hauser’’ de Werner Herzog se passa na Alemanha, mais precisamente na cidade de Nuremberg e abordará a história de um homem abandonado em praça pública que vivia em um cativeiro, e que, portanto, tinha um desenvolvimento incompleto e quase nulo da linguagem e de outros comportamentos também, sobre os quais o filme retratará com mais clareza em seu decorrer. Desta forma, a obra passou a ter forte relevância no campo das ciências sociais, principalmente no campo da sociologia. A história em si inicia-se em um cativeiro. Kaspar Hauser era apenas alimentado por um homem e seu processo de socialização era mínimo, ainda que o homem que cuidava do personagem tentasse iniciar o processo de codificação da linguagem, por meio da representação do código somado à ação, como na aprendizagem do verbo’’schreiben’’( escrever em alemão ) sequenciado do ato de ‘’escrever’’ logo em seguida, além do ato da repetição daquilo que se ouve. Aqui, sua fala dar-se-á através de gemidos e onomatopeias tal como um bebê. Outro ponto importante notável nesta primeira fase do filme consiste na dificuldade de Hauser ficar de pé. Em um segundo momento, ele será abandonado em uma praça pública na cidade de Nuremberg. É importante fazer a ressalva na incompreensão no seu processo de abandono, sem a demonstração de receio de ter de ‘’se virar sozinho’’, afinal a distinção do certo e errado ainda não existe, de forma que o personagem não tem nenhuma autonomia de si. Após isto, ele será resgatado por autoridades que buscarão entender sua ‘’demência’’, de forma que ele será preso e passará a conviver com o filho do guarda da prisão. É essencial notar o processo de socialização primária como a primeira vez comendo à mesa ou o primeiro banho. Outro fato é que Kaspar Hauser não demonstra ter qualquer pudor de ficar nu diante de outro adulto. Desistindo de cuidar do jovem ‘’inconsciente’’, as autoridades enviam-no a um circo, onde ele será tratado como uma aberração. Após um processo de

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fuga do circo, Hauser será encontrado por um professor com quem conviverá pelo resto de sua vida. Dois anos se passam na convivência ao lado do professor. Nesta parte, pode-se observar que o já ‘’desenvolvido’’ personagem já terá desenvolvido sua capacidade de fala, ainda que de forma pausada [ o processo em si do desenvolvimento da fala não é tão bem explicitado no filme ], a capacidade de ter sentimentos, no momento em que Kaspar Hauser chora após ouvir a música tocada no piano, além da clara negação à religiosidade, ou melhor, da negação de Deus, no momento em que os padres vêm disseminar sua palavra na casa do professor. Após a ilustração destes processos evolutivos no que se refere ao campo da socialização e do desenvolvimento de habilidades vitais, Hauser sofrerá um atentado que é apresentado de forma um pouco enigmática no filme. Depois disso, fica clara a vontade do personagem voltar para a casa do professor e permanecer lá dentro, onde ele poderia ter tranquilidade. O filme termina com a cena, na qual Kaspar Hauser passa por uma autópsia que determina uma anomalia em seu cerebelo, o que parece satisfazer as autoridades com o ‘’descobrimento’’ do grande mistério que rondava aquele homem, quando na verdade seu retardo era proveniente da falta de socialização, uma necessidade para nós seres humanos. Deste modo, podemos relacionar o conteúdo abordado no cinema com obras publicadas e desenvolvidas no campo das ciências sociais. É muito clara no filme a necessidade da socialização do homem, afinal como já afirmava Zygmunt Bauman em ‘’Aprendendo a pensar na sociologia’’, nós somos os seres dentre os quais mais necessitam do outro para a formação de uma identidade, distinguindo assim, padrões de comportamentos ‘’certos’’ ou ‘’errados’’ de acordo com as concepções da civilização. Nesta obra, Bauman também cita o filósofo George Mead, que trabalhará com a questão da percepção do ‘’eu’’ e do ‘’mim’’. Um processo que se dá por incompleto com Kaspar Hauser, afinal ele não era capaz de perceber o ‘’eu’’, pois não se enxergava como ser humano, afinal o ‘’outro’’ será sempre o 2

espelho para o ‘’eu’’ e como este ‘’outro’’ esteve presente em sua vida, tal como na relação de um dono que cuida de seu cachorro, foi impossível construir uma identidade de si e muito menos o ‘’mim’’, dada a falta de experiências em grupo. O que se nota na prática é o processo de construção do ‘’eu’’ dividido em estágios segundo Mead, sendo que nas primeiras cenas, apenas o primeiro deles (estágio preparatório) - que consiste nas respostas alheias ainda sem o estabelecimento de um sentido - , é explicitado. Mas talvez, o grande trunfo da teoria na prática está no processo de socialização descrito por Bauman no primeiro capítulo e dividido em socialização primária e secundária. Se tomarmos o conceito de socialização do autor em questão como o processo de formação de nosso ‘’self’’ e de como nossos instintos podem ou não ser reprimidos, é cabível afirmar que este processo se deu de forma tardia com o personagem, afinal seu ‘’self’’ somente foi formado através da convivência diária com um professor, afinal em cenas anteriores Hauser ainda não havia desenvolvido percepções como de tristeza, alegria, ato reflexo ou vergonha, por exemplo. Ainda no campo da socialização, o processo primário, isto é, do desenvolvimento da linguagem e dos hábitos dar-se-á no filme de forma mais forte quando Hauser convive com os filhos do guarda da prisão onde estava. Neste momento, lhe são ensinados hábitos como comer com a postura correta e expressões da língua, por meio da associação da fala com o físico, ainda que não houvesse o estabelecimento de um sentido estabelecido para aquelas palavras como no caso adjetivo alemão ‘’leer’’( vazio). Após mostrar um copo vazio, o personagem fixou a palavra ‘’leer’’ em sua mente e começou a denominar qualquer coisa por ‘’leer’’. Ao passo que o processo de socialização secundária, isto é, do estabelecimento de preferências ocorrerão de forma mais forte somente após a convivência com o professor. O professor será essencial para aquilo que Norbert Elias chama de processo civilizador, pois o estabelecimento de preferências contribuirá para a ideia de certo ou errado, o que gerará de forma mais forte o controle de suas emoções como, por exemplo, a ideia de ser proibido de arrotar à mesa, entre outras. Esta matriz de percepções de mundo advinda de uma estrutura 3

estruturada e estruturante será denominada‘’habitus’’ por Pierre Bourdieu. Deste modo, após três anos de convivência com o ‘’outro’’, Kaspar Hauser começa a ter sua identidade formada. O filme ilustra de forma satisfatória este processo, sendo indubitavelmente, um grande complemento para as ciências sociais.

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