EPOS e Romance. PDF

Title EPOS e Romance.
Author Ana Paula Carreiro
Course Introdução aos estudos literários
Institution Universidade Federal de Goiás
Pages 3
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Summary

Trata-se de um texto contrastivo e comparativo entre as duas grandes formas narrativas: a epopéia (e outras formas da antiguidade) e o romance (como gênero típico da modernidade). ...


Description

EPOS E ROMANCE (Sobre a metodologia do estudo do romance) Bakhtin Ao lado dos grandes gêneros, só o romance é mais jovem do que a escritura e os livros e, só ele está organicamente adaptado à leitura. É o único gênero que ainda está evoluindo no meio de gêneros já há muito formados e parcialmente mortos. Na segunda metade do século XVIII, a época da supremacia do romance, quase todos os gêneros resultantes, em maior ou em menor grau, “romantizaram-se”. Aqueles gêneros que conservaram com tenacidade seu antigo cânone, adquiriram um caráter de estilização. Na presença do Romance, como gênero dominante, as linguagens convencionais dos gêneros estritamente canônicos começam a ter uma ressonância diferente, diferente daquela época em que o romance não pertencia à grande literatura. O caráter autocrítico do Romance, é o seu traço notável, como gênero em formação. O romance é o único gênero em evolução, por isso ele reflete mais profundamente, mais substancialmente, mais sensivelmente e mais rapidamente a evolução da própria realidade. A teoria da literatura revela a sua total incapacidade em relação ao romance. Com os outros gêneros, ela trabalha correta e precisamente, um objeto pronto, que foi construído de modo determinado e claro. Basicamente, a teoria destes gêneros acabados não conseguiu, até os nossos dias, adicionar quase nada de substancial àquilo que já fora feito por Aristóteles. Sua poética se tornou o fundamento imutável para a teoria dos gêneros. Tudo ia bem enquanto não se tocava no romance. O confronto do romance com o epos (gênero épico), apresenta-se, por um lado, como um aspecto da crítica de outros gêneros literários (em particular do tipo mesmo da heroicização épica); por outro lado, tem por objetivo elevar a sua significação como gênero-mestre da nova literatura. Particularidades que dizem respeito aos aspectos temáticos da estrutura do gênero romanesco (estas particularidades, melhor que tudo, se desenvolvem e se explicam por intermédio da comparação do romance com a epopeia) 3 traços constitutivos da epopeia: o passado nacional épico ou passado absoluto, a lenda nacional e, o mundo épico isolado da contemporaneidade ou seja, do tempo do escritor/ouvintes. A memória, e não o conhecimento, é a principal faculdade criadora e a força da literatura antiga. A experiência, o conhecimento e a prática (o futuro), definem o

romance. A idealização do passado nos gêneros elevados tem um caráter oficial. Já o romance está ligado aos elementos eternamente vivos da palavra e do pensamento não oficiais (a forma festiva, o discurso familiar, a profanação). “A poesia, então, dividiu-se em dois tipos, segundo a natureza do poeta. Pois os poetas mais sérios representavam ações belas e ações de homens de tal tipo, ao passo que os de natureza menos exaltada representavam a natureza homens inferiores, primeiramente escrevendo sátiras, assim como os outros primeiramente escreviam poemas e eulogias”. Aristóteles A vida atual, o presente “vulgar”, instável e transitório, esta “vida sem começo e sem fim” era objeto de representação somente dos gêneros inferiores. Mas, antes de mais nada, ela era o principal objeto de representação daquela região mais vasta e rica do cômico popular. É justamente aqui – no cômico popular – que é necessário encontrar as autênticas raízes folclóricas do romance. A nova posição do autor, primeiro e formal, na zona de contato com o mundo representado, que torna possível a sua aparição no campo de representação da imagem do autor. Esta nova situação do autor é um dos mais importantes resultados para a superação da distância (hierárquica) épica. A profecia é própria da epopeia, a predição é própria do romance. A profecia épica se realiza totalmente nos limites do passado absoluto. Ela não diz respeito ao leitor e ao seu tempo real. Já o romance quer profetizar os fatos, predizer e influenciar o futuro real, o futuro do autor e dos leitores. O romance tem uma problemática nova e específica; seus traços distintivos são a reinterpretação e a reavaliação permanentes. O centro da dinâmica da percepção e da justificativa do passado é transferido para o futuro. A entidade épica do homem se desagrega no romance segundo outras linhas: surge uma divergência fundamental entre o homem aparente e o homem interior e, como resultado, leva o aspecto subjetivo do homem a tornar-se objeto de experiência e de representação. Finalmente, o homem adquire no romance uma iniciativa ideológica e linguística que modifica a sua figura (um tipo novo e superior de individualização do personagem). O romance, enquanto gênero, desde o início se constituiu e se desenvolveu no solo de uma nova sensibilidade em relação ao tempo. O passado absoluto, a tradição, a distância hierárquica não tiveram nenhuma parte no processo da sua formação como gênero (eles desempenharam somente um papel insignificante em certos períodos da sua

evolução, quando este era submetido a uma certa “epização” como, por exemplo, o romance barroco). O romance se formou precisamente no processo de destruição da distância épica, no processo da familiarização cômica do mundo e do homem, no abaixamento da representação artística ao nível de uma realidade atual, inacabada e fluida. A nova e sóbria imagem de arte romanesca em prosa e a nova concepção crítica científica, fundamentada da experiência pessoal, se formaram lado a lado e simultaneamente. O processo de evolução do romance não está concluído. Ele entra atualmente numa nova fase. Nossa época se caracteriza pela complexidade e pela extensão insólitas de nosso mundo, pelo extraordinário crescimento das exigências, pela lucidez e pelo espírito crítico. Estes traços determinam igualmente o desenvolvimento do romance....


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