Resenha - A sagração da primavera PDF

Title Resenha - A sagração da primavera
Course História Contemporânea
Institution Universidade Federal de Pernambuco
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Resenha da obra: EKSTEINS, Modris. A Sagração da Primavera: A grande guerra e o nascimento da era moderna. ...


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EKSTEINS, Modris. A Sagração da Primavera: A grande guerra e o nascimento da era moderna. Trad. Rosaura Eichenberg. Rio de Janeiro: Rocco, 1991. Palavras-chave: Primeira Guerra Mundial; Soldados; Mentalidades Keywords: First World War; Soldiers; Mentalities Em sua obra, A sagração da primavera: A grande guerra e o nascimento da era moderna, o historiador canadense, especialista em história germânica e cultura moderna, e professor emérito da University of Toronto Scarborough, Modris Eksteins propõe uma análise da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) evitando as usuais perorações sobre determinadas batalhas ou generais, utilizando-se para isso da História Cultural. O início do século XX não trouxe somente a Primeira Guerra Mundial, mas também os movimentos de vanguarda cultural. Para o autor, esses fatos não são somente contemporâneos, mas estão intimamente ligados entre si. Eksteins escolhe como movimento cultural do início do século XX, a Sagração da Primavera, idealizada pelo erudito russo, Igor Stravinsky e realocada em dois atos no balé, por Vaslav Nijinsky. Esta obra vanguardista fugia das convenções estabelecidas até então do balé clássico e tratava de um tema pouco comum na época: o assassinato de uma jovem, sacrificada para que a primavera pudesse florescer. É neste ponto que o autor encontra uma clara relação: A do sacrifício de uma jovem com o sacrifício de milhões de soldados, com um objetivo final: no primeiro caso o florescimento da primavera, no segundo ganhar alguns metros na guerra de trincheiras. A obra literária, assim como o musical homônimo, se divide em Atos. No primeiro Ato do texto de Modris Eksteins, é descrito a mentalidade cultural e seu papel no início dos conflitos. O segundo ato – que terá os dois primeiros capítulos aqui resenhados - é dividido em 3 capítulos, onde o primeiro, denominado “Ritos de Guerra” trata dos movimentos da guerra, suas fases e a degradação dos envolvidos, já no segundo capítulo intitulado de “A razão na loucura”, o autor se propõe a analisar as mentalidades da sociedade do início do século XX e mais precisamente dos combatentes, o que os fazia permanecer nos fronts. Já no terceiro Ato, o autor salta alguns anos após o fim dos conflitos e trata das consequências da guerra além do plano material, mais precisamente do “novo homem” que surge após o conflito, o homem individualizado.

Em “Ritos de Guerra”, Modris Eksteins descreve com muita precisão a rotina dos combatentes durante as diversas fases da guerra, fazendo com que o leitor se torne um observador da cena descrita pelo autor, principalmente no que diz respeito ao contexto das chamadas “guerras de trincheiras”. O autor atenta para uma “ilusão”, que foi muito comum dentro do pensamento estratégico de ambos os lados da guerra no ano de 1915, a de um golpe decisivo que faria um dos lados ganhar a guerra. Este pensamento, só foi sendo reconsiderada, segundo o autor, após grandes derrotas dos Aliados em Second Ypres, Gallipolli, Neuve Chapelle, Festubert, Arras e Loos. Entretanto, somente em 1916 após o ataque alemão à Verdun, que a mentalidade do “golpe decisivo” foi totalmente deixada de lado. O ano de 1916 presenciou então o estabelecimento de uma “nova guerra”, a guerra deliberada de desgaste que levaria milhões de homens à morte, devido a decisão tomada de que somente pelo cansaço do inimigo se poderia ganhar a guerra. A partir deste ponto, toda a indústria foi mobilizada para fornecer os insumos necessários para a guerra, houve uma reorganização da força de trabalho, aplicou-se o racionamento de alimentos e os impostos foram reajustados, todo esse contexto transforma a guerra em um empreendimento exaustivo por parte dos envolvidos; a transforma numa guerra “total”. O autor exemplifica de forma perfeita o que ele considerava a essência do desgaste: Em Verdun, o General Falkenhayn reuniu, junto com suas tropas, 1.220 peças de artilharia para um ataque a uma frente de aproximadamente treze quilômetros. Estimava que, para cada duas vidas que seus exércitos perdessem, os franceses perderiam cinco. Essa era a própria essência do desgaste. (EKSTEINS, 2001, p.188)

Continuando a sua análise a respeito desta fase da guerra, Eksteins destaca que a tropa atacante, independentemente de números, era muito mais vulnerável que o defensor, apesar dos efeitos das barragens preparatórias sobre os nervos, e que quase que invariavelmente os defensores ganhavam a “corrida ao parapeito”. Sem perder o seu método historiográfico, o autor faz uma relação entre os atacantes e os defensores, onde o primeiro teria se tornado o representante do mundo do século XIX, um mundo agonizante, que havia sido demolido pela guerra; enquanto o segundo, teimoso, alarmado, rechaçador, animoso, atrevido, tornou-se o símbolo de um novo mundo nascente. O ambiente em que eram travados, e a percepção deste sob o olhar dos soldados também recebe destaque na obra de Eksteins. Ele apresenta os relatos dos combatentes a

respeito da chuva, do frio, além da presença de ratos e piolhos durante o tempo que ficavam nas trincheiras. Um ponto central de relatos dos envolvidos no combate, é o contato constante com a morte, com o horror e as atrocidades humanas que a guerra traz, e a institucionalização do horror e da morte propriamente dita, como sendo algo normal e corriqueiro. Posteriormente, Modris Eksteins ressalta o caráter questionador das normas e valores da sociedade liberal burguesa do século XIX, por parte dos alemães, até mesmo antes da guerra. Já durante a guerra, os alemães focaram desde o início na ideia da “vitória”, num vitalismo dionisíaco, que no momento da conquista final, ofereceria oportunidades primordialmente espirituais e vitalizadoras e apenas em segundo plano, territoriais e materiais. Sobre esse tema, Eksteins (2001, p.203) conclui: “A questão dos objetivos da guerra nunca passou de um expediente político que refletia as vicissitudes do front. Era o front que ditava os objetivos da guerra, não o contrário” Além do ataque à cultura e a sociedade, o uso de novas técnicas de guerra, como gás mostarda e lança chamas também suscetibilizou a noção presente de guerra das potências da Entente. O autor afirma que a Alemanha pretendia promover uma revolução no espírito europeu, e na estrutura de estado europeia, e conclui: O que importava para os alemães era sobretudo a derrubada das velhas estruturas. Esta era a verdadeira questão da guerra. Uma vez alcançado este objetivo, a dinâmica revolucionária passaria a erigir novas estruturas, válidas para a nova situação. (EKSTEINS, 2001, p. 2019)

Já em “A razão na loucura”, Eksteins se dispõe a apresentar o que ele considera como os verdadeiros protagonistas da guerra: os combatentes, e explicar as causas que o faziam dar a suas vidas nas trincheiras. No início do capítulo, Eksteins demonstra o perfil dos combatentes que formavam os exércitos envolvidos. Não se tratavam de exércitos profissionais, mas de exércitos voluntários, onde a ocorrência de casos de insubordinação e sedição era muito baixa se comparado ao número de combatentes e em vista das condições que teriam que enfrentar nas trincheiras, eram professores, mineiros de carvão, bancários, granjeiros, pequenos nobres, classe média urbana, trabalhadores e camponeses. A lealdade e o companheirismo entre os combatentes era uma constante nas fileiras. Isso não quer dizer, contudo, que os conflitos e motins não existissem, entretanto não combatiam o sentido da guerra em si, mas questões de logística do conflito. Além disso, a noção de “dever” passa a sustentar a permanência dos fronts e assim dar continuidade a guerra.

A concepção de “dever” está intimamente ligada à ideologia da classe média burguesa do século XIX, onde o progresso era imprescindível para a sociedade. Inclusive, o autor afirma que existia a crença que o progresso individual deveria estar intimamente ligado ao progresso coletivo; o bem-estar e harmonia do coletivo, ficavam acima do indivíduo. No decorrer da guerra e seu inevitável desgaste, a ideia do “dever” perdeu, força entre os combatentes, restando apenas o sentimento de companheirismo e dependência pelos companheiros de front. Eksteins, por outro lado, defende, que o gradativo desaparecimento

do

termo

“dever”

não

correspondia

necessariamente

ao

enfraquecimento do valor em si, mas sim da incapacidade desses homens de verbalizar suas experiências e sentimentos. Assim, mesmo quando não podia ser expressa de forma mais precisa, a ideia de “dever”, permanecia presente no imaginário comum desses homens. Em suma, Modris Eksteins apresenta uma visão diferente da segunda guerra, invertendo o prisma de percepção comum do leitor, que normalmente enxerga os soldados como apenas “força de guerra” do comandante e do estado em guerra, com uma ausência de vontade e individualismo que levava os combatentes por vontade própria e o sentimento de “dever”, acima supracitado, levando o leitor a perceber os combatentes não somente como os “heróis de guerra”, mas como seres conscientes que lutaram por ideologias próprias....


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