Zetetica e Dogmatica - Zetética e dogmática são dois diferentes enfoques teóricos a serem utilizados PDF

Title Zetetica e Dogmatica - Zetética e dogmática são dois diferentes enfoques teóricos a serem utilizados
Course Teoria Geral do Estado
Institution Centro Universitário UniFTC
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Zetética e dogmática são dois diferentes enfoques teóricos a serem utilizados no estudo do Direito. Um acentua o aspecto de pergunta do problema, mantendo abertas à dúvida suas premissas; já o outro aborda o ângulo de resposta, estabelecendo pontos de partida e buscando um curso de ação...


Description

AULA 2: ZETÉTICA E DOGMÁTICA JURÍDICA 1) EVOLUÇÃO DA CIÊNCIA DO DIREITO Uma teoria é uma explicação sobre alguma coisa, explicação essa que é feita mediante um conjunto de proposições. Uma teoria da física ou até mesmo da química pode ser considerada ultrapassada na medida em que se descobre, com os estudos, que seus pressupostos ou conclusões eram falsos. O mesmo não ocorre com a ciência do direito. Não há teorias jurídicas verdadeiras ou falsas. Há teorias jurídicas atuantes ou não atuantes. Isso porque as teorias jurídicas lidam com dados construídos pelo homem, e não dados fornecidos, prontos. O direito é construído, e não descoberto, encontrado. O que se estuda nas ciências jurídicas é a possibilidade de determinadas teorias serem atuantes na sociedade em que se desenvolvem, bem como as conseqüências da atuação dessas teorias no convívio social. O fim pacificador do direito é sempre verificado. É sempre a finalidade do cientista do direito. No momento das análises científicas, o teórico deve verificar se o direito estará cumprindo seu papel de regrar e possibilitar a vida harmoniosa em sociedade. A peculiaridade da ciência do direito se dá em razão da comunicação das teorias. Expliquemos melhor: quando um teórico estuda determinado assunto, ele se dispõe a comunicar suas investigações. Assim é que, muitas vezes, uma teoria matemática pode ser demonstrada mediante uma equação. Essa comunicação assume, sempre, um caráter informativo. Em outras palavras, no exemplo da matemática, formula-se uma equação com a finalidade apenas de comunicar a teoria, informando o que acontece. Exemplo: temos a teoria da adição, mediante a qual 30 + 50 = 80. Há, simplesmente, uma descrição de como as coisas acontecem. Porém, com o direito não é tão simples assim. O direito tem o escopo de regrar a sociedade, direcionando os comportamentos dos seres que dela fazem parte. Isso indica a chamada função diretiva da comunicação. A linguagem utilizada pela ciência do direito não somente busca informar sobre as teorias, mas também determinar como devem se dar os comportamentos humanos, qual é o ideal, o correto. Em outras palavras, as proposições podem ter a função de direcionar comportamentos, além da função de informar as teorias. Essa diferença é muito bem explicada pelo grande jurista Tércio Sampaio Ferraz Jr: “Uma comunicação tem sentido informativo quando utiliza a linguagem para descrever certo estado das coisas. Por exemplo, “esta mesa está quebrada”. Tem sentido diretivo quando a língua é utilizada para dirigir o comportamento de alguém, induzindo-o a adotar uma ação. Por exemplo,

2 “conserte a mesa”. Ora, quando um físico define o movimento, prepondera a função informativa. Suas definições teóricas superam-se à medida que o estado de coisas referido muda, ou porque se descobrem novos aspectos relevantes, ou porque os aspectos antes tidos por relevantes não o são mais. Já quando o jurista define a posse, mesclam-se as duas funções. Ele não informa apenas sobre como se entende a posse, mas também como ela deve ser entendida. Assim, suas definições teóricas superam-se à medida que deixam de ser guia para a ação. No caso do físico, a definição é superada porque se tornou falsa. No caso do jurista, porque deixou de ser atuante. Ou seja, as definições da física, em geral, são lexicais, as do jurista são redefinições. Nesse sentido, se diz também que a ciência jurídica não apenas informa, mas também conforma o fenômeno que estuda, faz parte dele. A posse é não apenas o que é sociamente, mas também como é interpretada pela doutrina jurídica.”1

Logo, importa que a ciência do direito lida com as funções informativa e diretiva da linguagem na comunicação de suas proposições.

2) ZETÉTICA E DOGMÁTICA Continuando o pensamento anterior é possível que um estudo do direito se dê apenas no plano informativo. Dizendo de outra forma, é possível que as proposições de uma teoria tenham somente a tarefa de informar. Mas há também, como já demonstrado acima, a possibilidade de as proposições de uma teoria terem a função de direcionar comportamentos. Aí que entra a distinção proposta por Tércio Sampaio Ferraz Jr. entre enfoque zetético e enfoque dogmático da ciência do direito. Ora, se o que se busca no estudo do direito é privilegiar a função informativa da linguagem dizemos que prepondera o enfoque zetético. Se, ao contrário, se busca ressaltar a função diretiva, temos o enfoque dogmático do estudo do direito. Vejamos pormenorizadamente a distinção entre ambos: Zetética deriva de zetein, que significa perquirir, questionar. Dogmática advém de dokein, que significa ensinar, doutrinar. Ao longo do curso de direito muito se ouvirá falar em dogmática jurídica. Quase nada ouvirão sobre zetética. Tércio Sampaio Ferraz Jr, ensina, com a maestria de sempre: “O enfoque dogmático revela o ato de opinar e ressalva algumas das opiniões. O zetético, ao contrário, desintegra, dissolve as opiniões, pondoas em dúvida. Questões zetéticas têm uma função especulativa explícita e são infinitas. Questões dogmáticas têm uma função diretiva explícita e são finitas. Nas primeiras, o problema tematizado é configurado como um ser (que é algo?). Nas segundas, a situação nelas captada configura-se como um dever-ser (como deve ser algo?). Por isso, o enfoque zetético visa 1 Introdução ao estudo do direito, p. 39-40.

3 saber o que é uma coisa. Já o enfoque dogmático preocupa-se em possibilitar uma decisão e orientar a ação”.2

Latente, pois, que o enfoque zetético se relaciona com a função informativa da linguagem, ao passo que o enfoque dogmático se ocupa da função diretiva. No enfoque zetético não se admitem como verdadeiras as premissas da investigação científica, isto é, os questionamentos voltam-se inclusive às premissas. Ocorre o contrário no enfoque dogmático: se as premissas da investigação forem colocadas em dúvida, haverá prejuízo do aspecto diretivo do direito. Tomemos um exemplo: Quando um policial militar se depara com uma situação em que um sujeito tenha subtraído um objeto de outro, ele deverá, imediatamente, prender aquele, pois ele praticou um crime (furto). Nesse exemplo não é permitido ao policial colocar em dúvida algumas premissas tais como o que significa crime, qual o motivo do furto, etc. O enfoque do policial é dogmático, pois visa, em último caso, direcionar o comportamento das pessoas, informando-as de que furtar é errado. Se, ao invés de efetuar a prisão, o policial começa a questionar as premissas, seu enfoque será zetético, pouco prático, e o ladrão fugirá.

a) Disciplinas zetéticas São chamadas disciplinas zetéticas aquelas que não são jurídicas propriamente ditas, são gerais, mas que admitem o direito como objeto de estudo. Exemplo: sociologia (sociologia jurídica); filosofia (filosofia do direito); história (do direito); antropologia (jurídica) etc. “Vamos partir de um exemplo. Suponhamos que o objeto de investigação seja a Constituição. Do ângulo zetético o fenômeno comporta pesquisa de ordem sociológica, política, econômica, filosófica, histórica etc. Nessa perspectiva, o investigador preocupa-se em ampliar as dimensões do fenômeno, estudando-o em profundidade, sem limitar-se aos problemas relativos à decisão dos conflitos sociais, políticos, econômicos. Ou seja, pode encaminhar sua investigação para os fatores reais do poder que regem uma comunidade, para as bases econômicas e sua repercussão na vida sociopolítica, para um levantamento dos valores que informam a ordem constitucional, para uma crítica ideológica, sem preocupar-se em criar condições para a decisão constitucional dos conflitos máximos da comunidade. Esse descompromissamento com a solução de conflitos torna a investigação infinita, liberando-a para a especulação.”3

b) Disciplinas dogmáticas

2 Op. cit., p. 41. 3 Tércio Sampaio Ferraz Jr. Op. cit., p. 44.

4 São disciplinas que partem de dogmas/premissas que não podem ser tidos como verdadeiros ou falsos, mas que em razão da dúvida, alguém acaba fixando-os na sociedade e impondo sua obrigatoriedade. Peguemos o exemplo de um fato social que pode ou não ser caracterizado como crime. O fato de casar-se já sendo casado, ou seja, casar-se pela segunda vez, é considerado crime pela nossa legislação. A lei que caracteriza (tipifica) tal conduta como crime é uma decisão fixada por uma autoridade que impõe sua obrigatoriedade. Mas percebam que, uma vez existente a lei, o estudo dogmático não mais indagará se tal lei é ou não justa, qual seu papel social, quais suas conseqüências em determinadas regiões do país. O estudo dogmático se preocupará com os detalhes da regra, não negando sua existência. O fato de considerarmos a poligamia como crime indica que escolhemos esse dogma, essa opinião, como correta. A partir desse momento, não se discuto, no enfoque dogmático, se tal regra é justa ou não, se a poligamia foi permitida em alguns momentos da história, etc, pois isso cabe ao enfoque zetético do problema, da questão. Não se pode, portanto, negar certos pontos de partida no estudo dogmático, sob pena de não se chegar a resultado prático nenhum (lembrem-se da anedota de Sócrates sobre o policial que perseguia um ladrão). Trata-se do princípio da inegabilidade dos pontos de partida. No direito brasileiro, o ponto de partida que nunca se nega é o texto legal. Não se questiona a existência ou não do texto, mas sim quais devem ser suas conseqüências jurídicas (e não sociais) no cotidiano. Assim, todas as disciplinas que partem dos campos sociais preenchidos pelo legislador são disciplinas dogmáticas: direito constitucional, direito civil, direito processual civil, direito penal, direito empresarial, direito penal, direito administrativo, direito previdenciário, direito do consumidor, direito eleitoral etc. Nos ocupamos, numa faculdade de direito, muito mais das matérias dogmáticas do que das zetéticas. Isso tem explicação: a preocupação é formar profissionais que lidarão com problemas concretos. Serão juízes, promotores, advogados. Porém, o excesso no enfoque dogmático sempre atrapalha o jurista, pois antes de jurista é necessário que seja humano, o que só é possível mediante um paritário enfoque zetético da ciência do direito....


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