Resenha do documentário A Corporação PDF

Title Resenha do documentário A Corporação
Author Isabelle de Castro Rocha Sampaio
Course Psicologia Social do Trabalho e das Organizações II
Institution Universidade Federal do Ceará
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Summary

Resenha crítica do documentário A Corporação para a disciplina de Psicologia Social do Trabalho e das Organizações III....


Description

Resenha do documentário A Corporação Isabelle de Castro Rocha Sampaio Universidade Federal do Ceará The Corporation (A Corporação, em português) é um documentário de 2003, dirigido por Jennifer Abbott e Mark Achbar, o qual busca discutir acerca do modus operandi das corporações e das consequências destes para a humanidade e para a sustentabilidade do planeta Terra. O formato e o conteúdo do documentário foram influenciados pelo livro “The Corporation: The Pathological Pursuit of Profit and Power”, em que o autor Joel Bakan constrói uma espécie de perfil psicopatológico das corporações, de forma a discutir como elas foram construídas, por vias jurídicas para funcionar como uma “mente psicopata”, para que assim possa alcançar seu objetivo: lucrar. Desta forma, os critérios de personalidade psicopata formulados pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSMIV) funcionam, também, como linguagem narrativa, sobre a qual o documentário se estrutura para apresentar casos de crimes ambientais contra corporações, entrevistas de ativistas políticos e empresários, entre outros recursos audiovisuais, os quais irão construir, ao longo da obra, o perfil de comportamento das grandes corporações. Historicamente, as corporações existem há cerca de 150 anos como organizações de trabalhadores de determinada categoria profissional. Ao longo desse período, elas cresceram e se estruturaram de forma cada vez mais complexa, ampliando seu poder e influência sobre a Política, o Comércio e a Sociedade. Não por acaso, o documentário começa com um caso emblemático que mudaria tudo: a afirmação pela Corte Superior dos Estados Unidos da América de que as corporações teriam caráter de pessoa jurídica perante à Lei. Desta forma, não mais acionistas, diretores ou profissionais em cargo de chefia seriam julgados por crimes cometidos pela empresa, mas a Corporação em si mesma. Como estas não podem ser presas fisicamente nem detidas, outras punições foram criadas para garantir que o crime cometido fosse reparado, sobretudo através de restrições comerciais e pagamentos de indenizações. Ao considerar que a Corporação pode ser responsabilizada e punida por seus comportamentos, cria-se uma nova personalidade. Afinal, tal responsabilização não será do encargo de pessoas nos postos de liderança e poder da empresa, tampouco da soma dos comportamentos individuais de cada trabalhador. A partir disso, seria possível propor um perfil psicológico que nos ajudasse a compreender o modo de funcionamento desta nova personalidade. A tese do escritor Joel Bank é de que a Corporação é estruturada para ser patológica. Inspirada nesta tese, os produtores e diretores Jennifer Abbott e Mark Achbar apresentam alguns critérios do DSM-IV para a identificação de traços de psicopatia e mostram casos que corroboram que as Corporações se encaixam neste perfil, em vista de

que elas, como psicopatas, possuem aparente ausência de remorso, irresponsabilidade inconsistente, desrespeitam e violam as leis e os direitos de outras pessoas e são mentirosas compulsivas. Episódios

de

catástrofes

e

devastações

locais

são

consideradas

como

oportunidades de lucro, de forma que comunidades são exploradas e conflitos armados e políticos incentivados para manter a desordem social ou mesmo para manter líderes totalitários que possam trazer vantagens econômicas para diversas corporações. Além de explorar os recursos naturais e privatizar patrimônios públicos (áreas florestais, rios, nascentes, etc.), as corporações se utilizam de trabalho escravo e de trabalho infantil para diminuir os custos da sua produção e, assim, lucrar mais. Não somente pessoas envolvidas diretamente na linha de produção são exploradas e oprimidas, mas os próprios consumidores são controlados por propagandas abusivas, persuasivas e cada vez mais constantes e imperceptíveis, de forma a criar incessantemente o desejo de consumo de marcas. Como se consumir tal marca, como por exemplo a Adidas, fosse se construir à sua identidade: jovial, descolado, legal, atual, moderno, belo, desejável. O documentário se organiza de forma didática, de forma a explorar questões pertinentes para entendermos a lógica destrutiva de funcionamento das corporações. O mais interessante, julgo, é a apresentação de diferentes argumentos, tanto de ativistas políticos e intelectuais que estudam o impacto desta lógica nas relações humanas, quanto de empresários que aderem ao processo de maximização de lucros e questionam que ele é fundamental para a geração de empregos e de riquezas. Desta forma, o documentário nos apresenta diversas formas de análise que complexificam e enriquecem o debate, sem jamais apelar somente para uma simples culpabilização das grandes corporações como fonte de todo o mal na humanidade. Pelo contrário, elas são construídas por seres humanos com ideologias conflituosas que buscam formas de modificar a lógica de hiperpredadorismo e exploração que antes parecia ser inerente ao modus operandi destas corporações. O documentário brinca com nossas preconcepções e inverte o jogo ao nos mostrar que algumas das pessoas que trabalham nas posições de comando dessas empresas não são monstros que buscam somente e unicamente lucro acima de qualquer valor, mas são pessoas como nós, que se preocupam com o desequilíbrio ambiental, com o crescimento da pobreza e a exploração do trabalho humano. Desta forma, ao estarem nas posições que ocupam, estas pessoas têm a possibilidade de mudar os processos de produção das empresas e investir em ações de conservação ambiental e desenvolvimento humano. A questão sobre a possibilidade de mudança na atuação das corporações se torna ainda mais complexa se analisarmos os movimentos atuais lançados por determinadas marcas para a adoção de medidas e campanhas ecossustentáveis que visam gerar mais lucro, em vista de que movimentos de conservação ambiental, redução do consumo de

plásticos e materiais não-biodegradáveis estão sendo amplamente adotados por consumidores do mundo inteiro, sobretudo por causa do crescimento de discussões sobre consumo sustentável e veganismo. A pressão dos consumidores é forte o bastante para que marcas como a Chanel, Gucci e Armani anunciassem que deixariam de usar pele de animais para a fabricação de roupas e acessórios (G1, 2018). De forma semelhante, a marca de cervejas Corona anunciou em 2019 que investirá em pesquisas para a produção de materiais biodegradáveis com o propósito de deixar de usar totalmente plástico em engradados e embalagens (THE GREEN POST, 2019). A Adidas, marca de roupas e acessórios esportivos, foi outra a aderir ao marketing sustentável ao criar sapatos com plástico retirado dos oceanos e a lucrar com a venda de cerca de um milhão destes sapatos (ÉPOCA NEGÓCIOS, 2018). As duas últimas ações foram realizadas em parceria com a Parley for the oceans, organização com fins lucrativos que colabora com grandes marcas para a criação de programas e ações que diminuam o impacto do hiperconsumo humano nos oceanos, outra forma de marketing e de produção que atinge as expectativas de novos consumidores. Contudo, será possível existir um consumo ético dentro dos moldes capitalistas? Não existe, acredito, um desaceleramento na produção nem no consumo em massa, mas de maneiras diferentes de produzir e de consumir. Quando uma nova “ética de consumo” se estrutura, os modos de operação das corporações se modificam para atender essas novas demandas e apropriá-las para se encaixarem em seus modos e metas de venda: nunca reduzir, mas crescer e conquistar mais relevância no mercado. Atualmente, marcas que investem em ações socioambientais possuem mais relevância, e assim, continuam a ser mais consumidas do que outras. Além disso, estas corporações continuam a poluir e explorar o trabalho humano em determinados lugares do planeta em que a escassez de políticas trabalhistas e ambientais não controlam e fiscalizam suas produções. Elas agem fazendo concessões, justificando que é necessário explorar e poluir em determinados lugares para ter o dinheiro para investir em políticas de redução dos impactos que elas mesmas produzem em outros lugares, como foi discutido no documentário. Ao dizerem que estão mudando e repensando seus processos de produção, na verdade elas estão mentindo novamente para seus consumidores, como o documentário expõe mais uma vez. Há poucos anos, a própria Adidas foi acusada de usar trabalho escravo em fábricas na Indonésia (BBC, 2002). Devido às repercussões negativas, boicote no consumo de seus produtos e indenizações, a empresa criou um programa de combate ao trabalho escravo e chegou a ser considerada, em 2018, como a marca de roupas que mais combate o trabalho escravo segundo o monitoramento da ONG KnowTheChain (2018). O documentário denuncia esse constante conflito entre a afirmação de possíveis

ações éticas na sua cadeia de produção e a exploração desenfreada de recursos naturais e humanos. Considero que a estruturação desta discussão a partir de um diagnóstico de psicopatia auxilia para criar uma narrativa coesa e interessante, que prende a atenção do espectador e nos faz analisar por diferentes perspectivas as diversas questões éticas não somente sobre o modo de funcionamento das corporações, mas também sobre a forma como consumimos. Contudo, esta mesma estrutura aparenta ser sensacionalista em determinados momentos e parece acarretar na desresponsabilização das pessoas envolvidas na criação e na manutenção destas empresas. Apesar da crítica, o documentário permanece atual e extremamente importante para compreendermos sobre o que estamos lutando: não contra pessoas maléficas que controlam essas corporações, mas sobre todo um modo de produção de materiais e de subjetividades que busca nos assujeitar, nos explorar, e criar processos massificantes em que não seja mais possível questionar o que é produzido, mas somente o consumir de forma acrítica. Referências Adidas vende um milhão de tênis feitos com plástico retirado dos oceanos. Época Negócios Online. 14 de março de 2018. Disponível em: . Acesso em: 22 mar. 2019. Chanel deixará de usar pele de animais em coleções. G1. 05 de dezembro de 2018. Disponível em: . Acesso em: 22 mar. 2019. KNOWTHECHAIN. 2018 Apparel & Footwearbenchmark Findingsreport. 2018. Disponível em: . Acesso em: 22 mar. 2019. ONG acusa Nike e Adidas de explorar trabalhadores. BBC Brasil. 07 de março de 2002. Disponível em: . Acesso em: 22 de mar. 2019. THE GREEN POST. Corona anuncia programa para produzir engradados 100% sem plástico em 2019. Razões para acreditar. janeiro de 2019. Disponível em: . Acesso em: 22 mar. 2019. THE CORPORATION. Direção: Jennifer Abbott, Mark Achbar, Produção: Mark Achbar.Canadá: produzido de forma independente, 2003, 1 DVD....


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